segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Dos Arquétipos do Ideal Português às Instâncias da Realização de Si

Reflexão de Paulo Borges a partir de «O Espírito da Cultura Portuguesa» de António Quadros

Publicou António Quadros em 1967, em O Espírito da Cultura Portuguesa, um ensaio onde, procurando formular o que seria o “ideal português”, na linha das preocupações da Renascença Portuguesa, enuncia “um grupo de dez palavras ou cifras, cujo sentido ideal e simbólico se desdobrou na nossa cultura em vários planos significativos, desde o literal ao simbólico, do poético ao artístico e mesmo ao filosófico”. Diz serem “arquétipos” [...] cuja conjugação desenha porventura [...] o ideal português” e que seriam tónicas profundas do “nosso modo de filosofar” ou “palavras-mães” “que nos soam tão familiares [...] que nem reparamos na originalidade das meditações que nos sugerem”. Ilustra-o com sintéticos mas fecundos desenvolvimentos da premência na história, na cultura e no pensamento português, bem como das sugestões filosóficas e universais, das palavras nesta ordem apresentadas: Mar, Nau, Viagem, Descobrimento, Demanda, Oriente, Amor, Império, Saudade, Encoberto”.

I - Saudade
II - Oriente
III - Encoberto
IV - Demanda
V - Viagem
VI - Nau
VII - Mar
VIII - Descobrimento
IX - Amor
X - Império

Paulo Borges

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Pai, a noite (texto de Rita Ferro)

"Acordei com falta de paternage: uma saudade metafísica, um ódio pelo irreparável que não vos descrevo. Foi hoje, depois de acordar e antes de abrir os olhos, que passei revista às coisas que o meu pai me dizia e as confrontei com a minha vida. Sosseguei, porque ele passou pelo mesmo, mas partiu em paz. Quando, por razões pragmáticas, se é obrigado a viver sem transcendência, há ideias que parecem zombar da nossa condição. Mas só por fora. Enfim, tentarei reproduzir o diálogo que travámos, não sei se consigo; estes estados de semi-consciência são como os sonhos: parecem enormes, mas duram instantes. «Pai, eu não sou bonita...» «Filha, toda a beleza é aviso.» «Pai, eu não sei o que ando cá a fazer...» «Filha: percorre o teu caminho até ao fundo, e, com os versos que achaste, aumenta o Mundo!» «Pai, dois divórcios no papo e continuo sem saber o que é o amor...» «Filha: não sentirás tu a saudade do amor que não mereceste, de uma outra liberdade?» «Pai, eu tenho medo da morte...» «Filha: Sê um princípio, não um fim. Que depois de ti, as tempestades sejam outras e as lágrimas mais leves!» «Pai, eu não valho nada...» «Mexe-te: é preciso imitar Deus e criar outrem que não tu fora de ti.» «Pai, o tempo de Deus já lá vai...» «Enganas-te: o tempo de Deus é o tempo da atenção. O tempo de Deus é hoje.» «Pai, já tinha idade para não fazer asneiras...» «Não é verdade: a infância é eterna.» «Mas acha normal que eu tenha saudades do meu urso?» «Acho, mas cuidado: o infantilismo dos adultos é pior do que o seu demonismo.» «Não sei, queria tanto ter nascido num mundo melhor...» «Filha, confia em mim: esse mundo melhor é o mundo em que vivemos.» «Pai, por que é tudo tão difícil?» «Filha, simplificar não é assim tão fácil, no nosso tempo.» «Pai, a gente assiste a tanta batota...» «Não faz mal: o erro não é só educativo, é também cultural.» «E as mentiras que ouvimos, pai?» «Também fervo: o uso desonesto da palavra é um dos maiores flagelos da humanidade de hoje.» «E as guerras, pai, admitem-se?» «Filha, como homem cristão, a guerra é para mim um escândalo. Mas escândalo que me leva a tentar compreender...» «Pai, tenho remorsos: às vezes morrem-me pessoas queridas e esqueço-me delas no dia seguinte.» «Não tenhas: todo o amor que aparentemente morreu é todavia vivo» «O pai não está a perceber: eu já nem chorar consigo!» «É natural, querida: que humano hoje, pode e sabe não ser desumano?» «Pai, o pai também pecou?» «Claro, filha: fui puxado, atraído...» «Pai, às vezes sou má, outras vezes boa, e por muito que me esforce não consigo mudar.» «Sossega: se o homem é contradição e identidade, se o homem é vário e inconsciente, se o homem é bom e mau, se o homem é perene alteração, se o homem é repouso e evolução, abandono e vontade, acção e contemplação, egoísmo e ascetismo, se o homem simplesmente é, e se no seu ser cabe todo o universo, filha, assume-te simplesmente inteira, e nada excluas: a sensação ou a fé.» «Pai, ainda bem que partiu antes: nunca Portugal se deixou abandalhar a este ponto...» «Não te rales, canta comigo: ó meu Portugal que foste, que foste grande no mundo, abre as asas, abre as velas, revela o teu ser profundo!» «Pai: o pai acha que há salvação num mundo onde os filhos espancam os pais e as mulheres mandam os bebés de encontro às paredes?» «Filha: na hora destinal do fim, no limite do fracasso, no tempo cadente da derrota, eu canto, eu canto a esperança...» «Pai, os outros fazem-me sentir estúpida...» «Graças a Deus: Ele quis que, no fundo do abismo, os homens uns dos outros degraus fossem.» «Pai, lá fora ninguém nos liga...» «Tem calma: a nossa Arte contém todos os elementos necessários para se impor ao respeito e à admiração do Mundo.» «Pai, quem tem razão? A esquerda ou a direita?» «Querida: nenhum sistema ou nenhuma ideologia pode hoje considerar-se a salvo de suspeita, pode ver-se como solução absoluta, universal e salvadora.» «Sabe, pai? Eu já não acredito em nada...» «Filha, interrogar é já crer. A descrença humana não existe.» «Pai, serei ao menos mulher?» «Não sei, mas aprende: uma só mulher contém todas as mulheres e todas as mulheres não são ainda a mulher.» «Mas o pai sabe tanto...» «Enganas-te: só houve em mim perguntas sem respostas.» «Não minta, pai.» «Não minto: fui a perdida unidade que a inteligência sozinha não pressente.» «Mas, pai, eu não sei nada!» «E eu? Eu que tanto procurei luz e só encontrei noite?» «Noite?» «Sim: três vezes, noite, me debrucei sobre as ciências do sensível, três vezes me julguei vencedor, e três vezes reconheci que o resultado enganador era ainda, noite, a tua voz imperceptível; três vezes, noite, pedi à memória, à minha e à outra, à essência da história, a visão do amanhã, o dom da profecia, a luz no futuro projectada, prévia vidência da finalidade destinada; três vezes, noite, volvi o teu seio, três vezes filho da memória, três vezes agente da história, e apenas ao de leve logrei tocar na fugidia, fugaz razão, que atribuímos à acção, sem jamais todavia dominar, a absoluta verdade e liberdade do ser em perpétua criação.» «Pai, que estafadeira...» «Filha, que gozo!»"

Rita Ferro (filha de António Quadros) aqui e aqui

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Nova Águia Nº 2 - 2º Semestre 2008

ANTÓNIO VIEIRA
& o futuro da lusofonia

Inclui:
Texto de Adriano Moreira
O Território e o Mapa de João Teixeira da Motta (Com cartas de Agostinho da Silva, Cruzeiro Seixas, Dalila Pereira da Costa e António Quadros)
Inédito de Jean-Yves Leloup




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(Lista actualizada dos lançamentos da Nova Águia)