Bruno [...] radica toda a construção intelectual de A Ideia de Deus, em fenómenos auditivos inexplicáveis que experienciou e atribuiu a intervenções angélicas.
Leonardo Coimbra, falando da passividade mística, apontava no entanto para o acordo superior das duas formas de pensamento humano - a científica e a mística.
Obra contrapolar de outras, marcadamente lógico-científicas, como A Razão Experimental, o seu livro A Alegria, A Dor e a Graça, está inteiramente repassado de uma sensibilidade mística, descrevendo a natureza, as criaturas, os seres humanos, Deus, como em verdadeiro trânsito da percepção sensorial para a apercepção espiritual, como em anunciação de uma fenomenologia ontopneumatológica pessoalmente vivida.
Álvaro Ribeiro, também com algumas reservas perante o pensamento místico, tanto no cristianismo como no budismo, admite em a A Arte de Filosofar uma gnoseologia da intuição, da imaginação, do sonho e da visão contemplativa, desde que pensadas à luz da razão conceptuante, à luz de um racionalismo aberto para o mistério.
José Marinho transporta abertamente a realidade da experiência mística ou unitiva como visão, visão unívoca, para o seu sistema filosófico. Ela é, a visão unívoca, como que a vivência agraciada que para os homens será o ponto luminoso pelo qual podem experienciar fugazmente a relação enigmática entre o Ser da Verdade e a Verdade do Ser, mau grado o mundo de cisão em que vivem.
Quanto a Afonso Botelho, na recente suma do seu pensamento que intitulou Da Saudade ao Saudosismo, elevou ao nível especulativo e filosófico as intuições de Pascoaes e de outros poetas saudosistas, delineando o conceito de uma filosofia gnoseológica da saudade, com nítidas afinidades místicas.
O livro [Místicos Portugueses do Século XVI] de Dalila Pereira da Costa, porém atinge uma dimensão singular na exegese da literatura mística, porque na sua personalidade se encontram harmoniosamente, tanto a inteligência hermenêutica apoiada na mais sólida cultura, como a predisposição e «saber de experiências feito» de quem é, ela própria, uma espiritual, uma mística, autora das páginas mais fulgurante de A Força do Mundo ou de Os Jardins da Alvorada.
António Quadros
Memórias das Origens, Saudades do Futuro (1992) pp.58-59
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