"(...) o ideal literário de Duhamel é contar o homem médio, o pequeno burguês parisiense que vive em quatro compartimentos com um ordenado demasiado estreito para extravagâncias, o pequeno burguês e todo o complicado processo que forma a sua não menos complicada personalidade - os seus actos, os seus sentimentos, os seus ideais, as suas convenções. (...) Para interessar o leitor, era preciso que as personagens de Duhamel, além de homens médios tipos, fosse originais, susceptíveis de prender fortemente a atenção. E pronto. Um caso original, raro, um desfecho imprevisível, carácter diferentes, e eis o leitor preso, algumas vezes mesmo, prodigiosamente interessado.(...) A filosofia de Duhamel é amarga, despeitada, e o Diário de Salavin é um exemplo que ilustra perfeitamente esta afirmação. O homem que quer sair de si próprio e não o consegue, que continua sempre e desesperadamente homem. (...) Diário de Salavin é algo mais do que um retrato do homem médio, algo mais do que nós próprios, algo menos do que nós, mas tristemente, profundamente, nós."
António Quadros
Do prefácio a Diário de Salavin, de Georges Duhamel
Livraria Tavares Martins, Colecção «Contemporâneos» (dir. António Ferro)
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"Hoje, 7 de Janeiro, aniversário do meu nascimento, tomo a resolução de transformar a minha vida.
Chamo-me Luís Salavin. Tenho quarenta anos. Sou casado. Minha mulher é a mais doce e a mais afectuosa das mulheres. Não, sinceramente, não tenho nada a censurar-lhe, se exceptuar certas pequenas coisas que seria descabido citar neste momento solene.
Tenho a inapreciável felicidade de ainda possuir mãe. É muito velha. É uma pessoa admirável, uma perfeição. A sorte conservou-ma; fez-me este favor, a mim, tão indigno. Escrevo esta palavra em pleno conhecimento de causa e com a esperança de a ter aplicado pela última vez."
(p.17)
Georges Duhamel nasceu em Paris no dia 20 de Junho de 1884 e morreu em Valmondois no dia 13 de Abril de 1966. Em 1912 foi nomeado editor da revista literária Mercure de France, cargo que manteve até 1938, até ser substituído depois de ter sido considerado "anti-guerra". Só regressou à revista como editor em 1945. Trabalhou como cirurgião do exercito francês durante a 1ª Guerra Mundial. Em 1918 venceu o prémio Goncourt, pela obra Civilização, que relata algumas das experiência vividas durante a guerra de 1914/18. Em 1935 foi eleito membro da Academia Francesa, eleição que renunciou em 1946. Escreveu poesia, teatro, crítica, romance e foi presidente da Alliance Française. Duhamel recebeu diversas condecorações, nomeadamente a cruz da Ordem Nacional da Legião de Honra e screveu entre outras obras, O Natal de Rechoussat, Diário de Salavin, Caminho Escabroso, Fábulas do meu jardim, Clamor da Solidão, Confissão da meia-noite, Um mártir, etc.
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Georges Duhamel Fotografia de Henri Cartier Bresson (Junho de 1944) |
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