quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Denúncia da identificação ideológica

"(...) achamos ter chegado a altura de acabar com a perfídia de quem vê na filosofia portuguesa «a ideologia cultural de um fascismo lusitano», ou que o mesmo é dizer de uma ideologia que procurou «hiperbolizar o que no regime [salazarista] ia no sentido do culto patológico da «lusitanidade», ajudando até com veemência particular a radicalizar nos termos mais cegos e dementes uma política «imperial» cujas funestas consequências não escaparam a gente menos «visionária» e menos delirantemente «patriótica»*. De facto, E. Lourenço não sabe do que fala, pois na sua condição de estrangeirado nunca procurou saber o que António Quadros, sem ser salazarista, nem defendendo uma política «imperial», pensava sobre a missão providencial de Portugal no mundo. Por conseguinte, no entender de António Quadros, o messianismo português, herdando, a par de elementos cristãos e islâmicos, a noção hebraica de Povo Eleito, compreende em si mesmo uma ideia de Portugal que, não obstante as aparentes manifestações de uma cisão extrema, como as que se prefiguram na «autonomia» das antigas comunidades portuguesas, é algo que transcende todo o género de vicissitudes temporais e contingentes, como o território e a raça. (...)"

*E. Lourenço, O Labirinto da Saudade, Círculo de Leitores, 1988, p. 35.


Miguel Bruno Duarte
"Os  estrangeirados"
(texto originalmente publicado na revista  Leonardo)

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