"Quanto aos meus livros agradeço-lhe as suas palavras tão incitantes e compreensivas. Bem sei que a sua generosidade franciscana nunca está em falta mas mesmo assim fazem-me bem incitamentos como o seu, até porque muito poucos estímulos recebo: uns querem-me "mais filosófico"; outros chamam-me "demasiadamente filosofante". Ambas as exigências estarão certas do ponto de vista de exigência filosófica e literária, mas eu não posso deixar de ser como sou e quem sou. Sei que os meus livros têm grandes limitações porque me insiro numa "terra de ninguém" que não é bem filosofia e não é bem a da literatura, e isto deve-se talvez à minha excessiva dispersividade, filha talvez de múltiplas solicitações do meu espírito: filosofia, religião, arte, literatura, criação literária, acção... que hei-de fazer? Vivo demasiado no "mundo" e não tenho a força para dele me retirar por uma disciplina, dedicando-me exaustivamente a uma única via... e vou seguindo várias vias, sem talvez nenhuma aprofundar! Esta dispersividade é, temo-o, um sintoma de preguiça mental. E como tomo consciência destes obstáculos, ao menos dedico-me a valorizar os outros, os que não fracassam no seu caminho incansavelmente percorrido. E aqui está uma explicação psicológica da minha adesão à tese da filosofia portuguesa....
Conseguirei algum dia ter sossego, a calma e o silêncio para uma obra de lenta e segura maturação? Não sei. (...)"
António Quadros
em carta a João Ferreira
Lisboa, 30 de Março de 1967
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