"O erro daqueles que, nos últimos cem anos, em Portugal e alhures, atacam impetuosamente o mito e o mitismo, dando-lhes batalha sem concessões e sem quartel, foi o não terem querido ver em tais manifestações outra coisa senão destroços da idade teológica ou arcaica, aspirações ideais e irreais da alma humana ou formas de alienação do verdadeiro ser do homem. Foram confirmados na sua posição, é certo, pelos filomitistas, isto é, por aqueles pensadores, críticos ou poetas cuja paixão ilimitada e sentimental pelos mitos, ou pelo menos por certos mitos, os deixou sem defesa perante as armas racionalistas do criticismo.
Em tal paixão subsistiam, porém, elementos de verdade, que os mitósofos de variada proveniência não tardaram em discernir. O mitósofo diferencia-se do filomitista, em não fazer do mito um absoluto, em considerá-lo matéria experiencial, modo de revelação do ser do homem e canal de expressão de valores através do qual uma comunicação transcendente se estabeleceu ou estabelece. Atendendo ao mito, não se detém porém na sua realidade exclusiva, ultrapassa-o e integra-o numa visão mais vasta."
António Quadros
Introdução à Filosofia da História, Editorial Verbo, 1982, pp. 228-229
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