segunda-feira, 30 de agosto de 2010

António Quadros por ele próprio

"[...] O autor pertence ao tipo de navegadores lentos e pacientes, explorando velhos e novos espaços por sua conta e risco. Não sabe construir rapidamente brilhantes catedrais. Não pretende lisonjear as tendências da massa, da multidão, dos ideais dominantes. Não reconhece verdadeiramente adversários em sua volta, porque de todos se sente irmão, na origem da sua actividade, na geratriz da sua energia ao serviço de uma causa. O fio estreito sobre que caminho, a muitos parecerá insatisfatório e frustre. É, porém, o seu fio de Ariadna no labirinto da vida, tal como a pode visionar. Da imperfeição do seu pensar ou da banalidade do que julga descobrir, extasiado, frequentemente, com panoramas que outros já abriram, percorreram, analisaram antes dele - e porventura com mais minúcia [...] não se penitencia, porque o pensar dramático do pesquisador não dá espaço para a penitência: seguir adiante, porque os degraus formados e transpostos estão já queimados, calcinados, aniquilados. A aventura do pensamento - mesmo que só intenção, só desejo, só ideal -, não admite retorno. Nenhum lar, confortável ou árido, o aguarda. Envolto em nevoeiro, ficou para trás o porto de onde partiu. Dele conserva uma recordação, uma saudade, talvez uma herança. [...] Mas o autor, a estas observações, apenas pode replicar, desatento: que caminho, que regresso, que erros, que passado meio esquecido já, é esse? Tudo não foi mais do que a amálgama escaldante, em ebulição, de uma experiência que se concentra no presente, pronta a dar o salto para o futuro. Sensação penosa, dolorosa é, em verdade, para o escritor, reler o que ficou escrito, o que se fixou escrito é a cristalização do imperfeito. No mesmo instante em que termina um livro, relê-lo, é tentado a tudo destruir para recomeçar de novo. O mesmo nos aconteceu, mas compreendemos que recomeçar de novo seria recomeçar eternamente de novo, num ritmo infindável e destrutivo. Por isso, aqui damos esta obra ao leitor com todas as suas imperfeições e, até, com o excesso da sua ambição. Ensaiando uma busca que se nos tornou imperiosa, vamos criando, ao mesmo tempo, uma forma de ser, de estar e de agir, que esperamos possa ultrapassar os limites da subjectividade. [...] Iniciemos, pois, a nossa multiforme investigação agente."

António Quadros, O Movimento do Homem,
 Sociedade de Expansão Cultural (1963) pp. 18-19

domingo, 29 de agosto de 2010

ainda sobre o artigo de Miguel Real (Jornal de Letras, 1041)

"[...] apenas uma possibilidade, não, de modo algum, uma inevitabilidade, nem sequer, muito menos, uma obrigação. Não se trata aqui, com efeito, de instituir um “serviço filosófico obrigatório” de forma a garantir a existência da “filosofia portuguesa”. Esta existirá apenas enquanto existir pelo menos uma pessoa que, de forma inteiramente livre, se assuma na dupla condição de “filósofo” e de “português”. Que cada um de nós dê pois, se quiser, o passo em frente…" Renato Epifânio. Continue a ler aqui.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

A propósito do estado de saúde da Filosofia Portuguesa

"[...] Por muito que a alguns possa custar, pôr entre comas a Filosofia Portuguesa, como ontem o fez Real, não permite, de modo nenhum, significar que ela esteja comatosa (ou moribunda, ou defunta). Nem o seu estado de saúde pode, de resto, relevar do concerto enfatuado de umas quantas vontades. Nisto, como em tudo na vida, vale o velho dito de sabor judaico que manda conhecer as árvores pelos frutos. A colheita é sempre, e só, no futuro – e o mais é com Deus, verdades que desconheço se Miguel Real estará em condições de aceitar. " Pedro Martins. Continue a ler aqui.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

António Telmo sobre Marinho e Ribeiro

-António Telmo é considerado discípulo de Álvaro Ribeiro e de José Marinho. Como é a sua relação com a chamada Filosofia Portuguesa e que influência recebeu daqueles pensadores?

Devo-lhes tudo. Nós todos pertencíamos a esse grupo, mas em vez de um Mestre, como é costume, tínhamos dois. E os dois entendiam-se, olhavam para a mesma estrela mas os caminhos não eram os mesmos. Então aquilo fazia com que nós tivéssemos que estar sempre a ligar um ao outro, a ver como a coisa se ligava ou como se separava e isso exigia uma agilidade mental que se ia desenvolvendo até com o convívio, com o convívio com eles. Enquanto que o José Marinho falava muito, o Álvaro Ribeiro falava muito pouco, e tudo isso nos colocava num ambiente de grande veracidade. Todas aquelas coisas que preocupam os adolescentes, o amor e a relação com Deus, tudo isso aprendi ali com eles. Aprendi a clarificar a minha posição perante a Igreja, perante a Maçonaria, perante a política, e escrevi os meus livros. Embora os meus livros sejam originais porque não seguem nenhum deles, seguem… olhando também para a mesma estrela.

De uma entrevista de Américo Rodrigues a António Telmo para a Revista Praça Velha.

Homenagem a António Telmo


António Telmo, falecido no passado dia 21 de Agosto, será homenageado no dia 16 de Setembro, na Biblioteca Nacional, com a apresentação da obra O Portugal de António Telmo, organizada por Rodrigo Sobral Cunha, Renato Epifânio e Pedro Sinde. Participam ainda na sessão Miguel Real e Jesué Pinharanda Gomes. Mais informações aqui.

domingo, 22 de agosto de 2010

António Telmo 1927-2010

"Para o espírito que nega, se a demência for conseguida tudo o mais virá por acréscimo e consequência. É falso que o homem moderno viva em inquietação. Tornou-se indiferente ao que de monstruoso se vai produzindo, ao crime que perverte a natureza, a todas as formas de homogeneização que lhe destroem a individualidade. " António Telmo