domingo, 9 de dezembro de 2007

Rua António Quadros

Cerimónia de inauguração da Rua António Quadros:

sábado, 15 de Dezembro de 2007 pelas 11h.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Todas as recensões de António Quadros na Fundação Calouste Gulbenkian

Eis um exemplo: Narciso e Goldemundo de Hermann Hesse


sexta-feira, 30 de novembro de 2007

António Quadros Ferro, neto do escritor, teve a gentileza de me comunicar hoje, dia 29 de novembro de 2007, a boa nova da atribuição do nome de António Quadros a uma rua de Cascais. Recebi o mail de António Quadros Ferro, em Brasília, por volta das 18:00 horas. A reação imediata que tive foi compor uma notícia em forma de verso e colocá-la em http:www.usinadeletras.com.br, site brasileiro onde colaboram cerca de 8.000 escritores, entre os quais muitos portugueses. Para que mais leitores tomem conhecimento da figura invulgar de António Quadros. Fui amigo e companheiro de luta de Antônio Quadros pela afirmação de uma filosofia Portuguesa, colaborador de sua revista "Espiral". Fui também um dos primeiros conferencistas do Centro Nacional de Cultura, a que ele estava ligado juntamente com Afonso Botelho, António Braz Teixeira e Orlando Viorino. Minha conferência no Centro Nacional de Cultura foi em 1955. Eis a íntegra da memória que coloquei para ele no site brasileiro: www.usinadeletras.com.br.


A RUA DE UM PRÍNCIPE DA CULTURA PORTUGUESA EM CASCAIS
João Ferreira 29 de novembro de 2007
Agora ele está ali, em Cascais,
Cidade bela e nobre de Portugal,
Numa rua que tem seu nome
Escritor António Quadros (1923-1993)
Silencioso
Majestático
Pronto para ensinar
Para moradores da rua e transeuntes
O que foi Portugal histórico, sua tradição
E modernidade cultural
Ele será patrono e titular deste espaço
Para ser lembrado como português exemplar que viveu intensa paixão de amor às letras pátrias

Como símbolo de luta pelas causas maiores portuguesas
Ficará ali como senhor de um reino de cultura que está arquivado no simples enunciado e lembrança de seu nome
Como senhor nobre
Que incessantemente buscou e espalhou pelos cantos do mundo o saber e a cultura
Desde os maiores mitos
Até aos vultos mais representativos da cultura Portuguesa do século XX
Será sempre lembrado como editor e divulgador de Fernando Pessoa e do modernismo português
Como pesquisador, e divulgador de Pascoaes e Agostinho da Silva
Como alto representante do movimento da Filosofia Portuguesa
Como fundador do movimento 57
E da revista Espiral
Como autor de muitos livros... A toda a hora, na Rua António Quadros Muita gente perguntará Querendo conhecer sua biografia
E outras tantas pessoas saberão responder
E glorificar
Este grande cidadão português
Saberão filiá-lo a António Ferro, seu pai
E a Fernanda de Castro, sua mãe
Dois titulares da Literatura e da cultura Portuguesa
E a uma nobre família culta
Onde há descendentes escritores
De nome nacional
E na história urbana de Cascais
A rua António Quadros
Ficará como um livro exposto
E à disposição para quem o quiser abrir
E exercer a cidadania da memória!

João Ferreira
Brasília, 29 de novembro de 2007
Rua António Quadros:

António Quadros morreu em 1993 e não em 1994, como a placa indica.
Erro já comunicado pela familia do escritor à Câmara Municipal de Cascais.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Rua António Quadros




Rua António Quadros já existe. É em Cascais, perpendicular à Rua Adelino Amaro da Costa.
Só tardiamente tive conhecimento do ciclo A Filosofia Portuguesa no Século XX dedicada ao movimento da filosofia portuguesa e, especialmente, a António Quadros. António Braz Teixeira foi o orador. Foi no passado dia 20, na Sociedade Histórica da Independência de Portugal.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

alguns livros, em casa de antónio quadros
(...)Era um farol na noite escura; e a noite tornou-se mais noite, desde que a Morte o levou.

david mourão-ferreira, sobre António Quadros

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Altas, altas asas, recolhidas,
um dúbio sorriso, uma expressão
de alegria serena, talvez de ironia,
talvez ainda de êxtase ou paixão,
não sei,
a própria face do enigma, como a esfinge,
não sei, que o tempo,
corruptor do símbolo e da pedra
altera ou finge
a palavra dita e silenciada.

Diogo-Pires-o-Moço te esculpiu,
o povo te esqueceu,
fecharam-te em Coimbra num museu,
porque esse que teu ser mediu
não do português uma clara existência quis fixar,
mas a perturbante essência libertar.

Escândalo o teu olhar de paz,
escândalo ontem e hoje a tua beleza intemporal,
escândalo o não pareceres Portugal
na aparência angélica que nos dás.
Olhamos-te, nós, os impacientes
olhamos-te, os saudosos, os furiosos,
porque tarda a hora de o sonho se cumprir,
porque em nossa volta, descontentes,
só vemos sonhos frustrados,
seres dilacerados,
o campo de Alcácer Quibir
ainda e sempre,
orgulho e corrupção,
coragem e miséria,
as guitarras, a traição,
a pátria dividida,
a pressa, a inteligência transviada,
El-Rei Dom Sebastião,o seu fracasso, a sua ilusão,
a morrer ainda, devagar,
por esse país fora,
nas cidades, nas aldeias, nas montanhas,
a morrer de luxo e de pobreza,
de vaidade, de tristeza,
de curtas ambições,
de poder desregrado,
de habitual monotonia,
a morrer em almas indigentes,
em espíritos carecentesde alegria criadora,
de entusiasmo, de amor,
Dom Sebastião a morrer dentro de mim
dentro de mim que somos todos,
nas nossas cruéis batalhas interiores
entre a visão radiante do futuro
e a realidade pesada e envolvente
do presente.

Mas altas, altas asas recolhidas,
a própria face do enigma, como a esfinge,
assim Diogo Pires te viu
e para o amanhã que é hoje te esculpiu…
Apostou na esperança, contra dúvida!
Apostou na confiança de que em breve
as grandes asas vão abrir-se porventura
e de que o corpo da pátria, leve, leve,
é ser das alturas que perdura,
apostou que o povo da aventura,
filho do mar,
pai da descoberta,
apostou que a nau fracta do ocidente
no tempo encontraria
a sonhada harmonia
dos seus poetas,
dos seus profetas,
e com clara certeza realizaria,
cedo ou tarde,
depois de quedas e infernos,
depois de abjecções e cobardias,
depois de se ter cindido
e consumido
na inveja, no ódio, na baixeza,
na sujeição, na descrença, na incerteza,
no culto dos eventos positivos,
na negação da própria alma futurante,
cedo ou tarde criaria
o quinto império do amor,
o quinto império do espírito universal,
senhor
da fraternidade enfim,
da justiça e liberdade
fundadas na verdade
que a razão inquieta demanda,
como nau de descoberta rumando ao horizonte
na aliança do leme e do mistério.
Ninguém morre na saudade e na memória,
o tempo que flui não é um grande cemitério
onde jaz sepultada toda a história.
A beleza do Anjo de Coimbra
é o que restada gesta.
A sua paz, o seu sorriso,
é o ser português, inteiro e puro
voltado para o futuro.

Ó Portugal,
teu ser no mundo é divisão,
teu ser em Deus é união,
mas o enigma do teu mito em acto
descobre-se no anjo que é o teu retrato.

AQ

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

"Sou a perdida unidade que a inteligência sozinha não pressente..."

Reflexões sobre o Escritor

O escritor não tem verdadeiramente um lugar na sociedade, e isso paga-o em humilhações sem conta. O trabalho intelectual é de todos o mais mal remunerado. As iniciativas dos intelectuais são acolhidas com sorrisos. Ficamos então irremediavelmente desonrados, perante uma sociedade que em última análise triunfa?

in, revista Espiral (1966)

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Filosofar

"(...) Filosofar não é (...) somente construir grandes sistemas metafísicos demonstradores da agilidade e da fantasia da razão humana; não é desistir de conhecer as causas para se limitar a descrever as leis; não é substituir a exigência da verdade pelas exigências momentâneas da vontade; não é, tão pouco, repousar simplesmente sobre textos que, adlulterados por intermediários, tradutores e adaptadores, mais não comunicam do que fragmentos ou facetas isoladas da verdade. Filosofar é reflectir e racionalizar, tanto ou mais do que os textos, seja o idioma nacional, portador de palavras intraduzíveis e inefáveis, sejam as tradições escritas e orais da pátria do filósofo (...), sejam as obras poéticas, sejam as manifestações artísticas, sejam as revelações colectivas e particulares, e seja, por último, a experiência individualmente inspirada e comunicada ao pensador. (...)"


António Quadros, A Angústia do nosso tempo e a crise da universidade

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O finalismo e o a-finalismo do nosso sistema educativo

"(…) ao estudar, o fim do aluno é hoje «passar o exame», «ter o diploma» - e nada mais. O seu objectivo é quase unicamente utilitarista. Pretende o diploma porque o diploma dá acesso a posições social e economicamente compensadoras. Daí a sua total obediência, para não dizer escravização, à ciência do professor, que pode ser falsa, incompleta, desactualizada, pervertida e burocratizada, mas que não constitui para o aluno mais do que «o obstáculo que é preciso transpor», sem análises nem afirmações de personalidade que estariam deslocadas. Por sua vez, o professor, uma vez instalado na sua posição liceal ou universitária, limita a sua acção ao ensino de um conjunto de conhecimentos especializados, sujeitando inteiramente o aluno, ou a uma preguiça que o impede de actualizar-se constantemente no seu ramo de saber, ou a uma incapacidade intelectual para transcender o «conhecimento do compêndio», ou à especifica direcção cultural do seu espírito (…) observa-se que, ao longo dos anos da sua aprendizagem, o aluno apenas estudou para os sucessivos exames com que pretenderam medir a sua memória e a sua inteligente maleabilidade às atitudes culturais e espirituais mais diversas; e que esta diversidade heteróclita, acumulada nos anos cruciais da sua evolução mental, o levaram a deter-se cepticamente à beira dos grandes problemas da existência, não os vivendo heroicamente, mas, pelo contrário, substituindo, em todas as ocasiões, a verdade pela utilidade e pelo interesse.(…) o aluno universitário sabe mais do que o liceal – mas não sabe melhor. Ao obter, finalmente, o seu diploma de curso superior, o licenciado olha para trás e lamenta o tempo que perdeu em todas as matérias que fogem à sua especialização. Essas matérias assemelham-se às peças de «puzzle»: mas nunca as conseguiu reunir e agora já é tarde. Não se lhe apresentaram como «necessárias», como harmoniosamente ligadas, como tendendo, com a lógica indestrutível dos acordes diferentes, mas unidos, de uma sinfonia, para um mesmo objectivo.Licenciado, pode vir a ser um bom especialista, um bom profissional. Como homem, porém, será o que os caprichos da sua existência extra-univertária dele fizeram: família, cultura literária, influência de formas artísticas, amigos, formação religiosa ou política…E como estes factores sociais sofrem da mesma crise, espelhando a errada formação escolar básica, o resultado é a vida, em todos os seus planos antropológicos, cosmológicos ou teológicos, se reduzir à vida de cada um; cada homem passa a considerar-se o princípio e o fim de todas as coisas, a razão do «ego» domina as outras, a existência é um campo de batalha, não entre o bem e o mal, mas entre o «eu» e os «outros»."

António Quadros, «A Angústia do nosso tempo e a crise da universidade»

domingo, 14 de outubro de 2007

Oferecer aos homens da terra uma antevisão do céu conseguida por meios humanos...
António Quadros, in Introdução a uma Estética Existencial

terça-feira, 9 de outubro de 2007

requiem para um amigo que vai morrer, que já morreu


Movem-se os outros
À tua volta
Falam, suspiram,
Pensam em ti.
Olham-te e choram
Lembrando os tempos
Em que brincavas
No teu jardim
A vida é curta,
Curta demais.
Foge a alegria,
Foge a tristeza,
E fica apenas
Um quarto escuro
Um corpo imóvel
E uma saudade.
Olhos fechados,
Olhos de pedra,
És uma coisa
Não és mais nada.
Nem mesmo um beijo
Eles te dão.
Nem uma carícia
Na tua face.
Caem as lágrimas
Mas é mentira.
Tu já não és,
Só eles são.
Fazem projectos
Pensam em si,
Sob a trizteza
Luz e ambição.
Há já desejo
No olhar daquele.
Há já ternura,
Na alma da mãe.
Vem a vaidade,
Surge a inveja,
Mas a alegria
Submerge tudo.
E eles já sonham
Com a luz do sol,
E eles já sonham
Voltar a rir.
A vida é curta
Curta demais.
Vamos viver
Que o tempo passa.
Vais a enterrar.
Mas há as flores.
Desces à campa
E as aves cantam.
Há uma angústia,
Mas é o medo
Mas é a piedade
Da nossa dor.
E a terra cobre
O ser que foste,
E uma oração
Sobe para os céus.
Salva-o Meu Deus,
Ele era bom...
Só nesse instante,
Foste chorado:
Logo a seguir
Há que viver.
Repousa em paz
Não fazes falta.

Passaram anos
E a tua imagem
Assiste à vida...
Numa moldura.
E a tua imagem
Já nem sequer
Inspira aos teus
Uma lembrança.
Serves apenas
Para enfeitar
Uma saleta.
Não tenhas pena,
Pois todos morrem,
Pois todos passam,
E a morte ri
A par da vida.


António Quadros, Viagem Desconhecida

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

(...) Chamamos-lhes alunos. Deveríamos antes chamar-lhes discípulos, se fossemos capazes de ser mestres. (...)

António Quadros

terça-feira, 11 de setembro de 2007

criação e criador

"Visionamos a história como uma gama labiríntica e extremamente complexa de movimentos de primeira e de segunda instância, que mutuamente se buscam e se completam, se corrompem e se regeneram, se transformam por queda para logo se superar, concorrendo para uma mesma finalidade escatológica, mas sempre decorrentes do passo decisivo do homem, que não os originou, pois o consequente não pode originar o antecedente, mas que se finalizará como entidade mediatriz entre criação e criador."

António Quadros,
Introdução à Filosofia da História

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

O arquétipo do homem português

O homem português, ou melhor, o arquétipo do homem português é o que emerge e se revela em determinados períodos históricos favoráveis, mas é também o que se oculta ou é ocultado, o que se reduz a uma vida estagnada e recalcada, nos períodos em que se desfaz a sua «paideia». Uma «paideia», ao modo grego, é a solidariedade e a univocidade entre a estrutura cultural e o sistema educativo de um povo, ambos se ordenando a um «telos» ou a um fim superior, que todos então sentem como seu, pelo qual vivem, lutam e sacrificam se necessário for. Sem a restauração de uma «paideia» essencialmente portuguesa, não deixando de ser universal, será difícil, se não impossível, que o homem português se reencontre, numa reinvenção que ou começa pelas elites, pelas classes letradas, ou nunca mais será possível. Sem uma «paideia» portuguesa renovada jamais poderemos ter uma pátria portuguesa dinâmica, criadora de valores, voltada para o futuro a partir das suas raízes e das suas linhas genéticas fundamentais, sem as quais a nossa identidade se perderia num progressismo vazio e superficial.
Recorrendo à metáfora camoniana, assistimos nos últimos anos à vitória do Velho do Restelo sobre o Gama, o mesmo é dizer, da terra sobre a água e sobre os elementos aéreo e ígneo. (…) O que parece dominar hoje em Portugal é a face negativa, nocturna, decaída do arquétipo, do modelo ou da imagem sublimatória que o português já teve de si próprio e o levou a ousar rasgar os seus trilhos na superfície do mundo ou da vida. (…) Vivemos hoje um período de menoridade e de adolescência regressiva em que, predominando o intelecto passivo, as pessoas se auto-satisfazem e auto-iludem com os lugares-comuns ideológicos, com os discursos demagógicos e com as ideias convencionais de gerações que, para repudiarem um certo tipo histórico de nacionalismo, perderam a própria identidade e já não sabem quem são ou para que são, como portugueses.

António Quadros In, «Portugal, Razão e Mistério»

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Poética Contraditória

Não digas o que sabes nos teus versos,
Deixa para trás a ciência e a consciência;
Tudo aquilo que em ti não for ausência
São ideais perdidos, ou submersos.

Abandona-te às vozes que não ouves,
E liberta os teus deuses nos teus dedos;
Não busques os sorrisos, mas os medos,
E o que não for ignoto e só, não louves.

Ser misterioso e triste, é ser poeta:
Mesmo a luz que palpita nos teus cantos.
É uma imagem heroica dos teus prantos.

Percorre o teu caminho até ao fundo,
E com os versos que achaste, aumenta o mundo.
Não sejas um escritor, mas um profeta.



António Quadros, Viagem Desconhecida

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

[a António Quadros]



Eu não sei se o meu falecido avô paterno está vivo. Não tenho todavia em mim qualquer sinal da sua extinção. Pergunto por isso o que acontece ao nada quando não desaparece? O passado não sou eu mesmo – somente a saudade tomando conta desta ideia individual que guardo unicamente para mim, somente a saudade visível mas aparente ganhando espaço, crescendo comigo no meu movimento, a saudade no seu lugar recôndito, inerte, impassível, indiferente, em última análise, inexistente, sendo coisa nenhuma que alguém estupidamente transporta. A saudade que não tenho, que não quero e que não tive: uma coisa cega dos sentidos, ou do coração. A saudade não pensada, perdida, imaculadamente vivida, esmorecendo com o passar dos dias, ausentando-se com o extenuar da memória, extinguindo-se por completo no momento da nossa morte. A saudade que não existe e que ninguém merece. Por isso a saudade que sinto é em si fecunda, e exige ser gravada. Não a concebo separada da existência que a sofre. Não a entendo longe do pensamento que a imagina. Não a vejo, apesar de tudo, longe do espírito de quem verdadeiramente a sente. É por isso que a vida, como tantas vezes foi descrita, encontra-se na maioria das vezes sob algo maior. Há, em certa medida, uma morte antecipada, um silêncio surdo. Talvez a existência em certas ocasiões não exista em si mesma. Assim como a morte, a morte de alguém. Quantas pessoas conhecemos sem as conhecermos, ou quantas vidas achámos conhecer sem nunca as ter conhecido? Fica apenas uma imagem insegura de alguma coisa que apenas vimos passar. O luto é também ele menor e impassível. Por isso não acredito que o entendimento se interrompa assim. A aventura, a do conhecimento, seja ele qual for, deve perdurar. Deve seguir o seu movimento. Pulsando continuamente em nós, sem remissão. Repetindo-se e transformando-se connosco, numa relação contínua, por vezes dolorosa, mas que perdura, que vive, que verdadeiramente vive! Só no lugar onde a criação acontece, só nesse fulgor onde a verdade se encontra, só no silêncio dessa procura e espera, só no apelo dessa nossa solidão, só no nosso próprio medo, só no anseio da nossa interioridade, só na vontade de criar, de crer e de alcançar, só aí, só aí ascendemos e encontramos.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

o movimento

"o movimento é a libertação (e não a dependência) do potencial do ser"
antónio quadros

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Sábado, 28 de Julho - mais um excerto da obra de antónio quadros

O Mito Verdade ou Alienação
"(…) o mito é uma história exemplar e simbólica que, pelos actos dos seus protagonistas e pelo sentido do seu enredo, testemunha de uma antiquíssima experiência humana, mais profunda, de certo modo, do que a imagem cientifica, moderna e oficial das culturas; é a arca ou o arcano de uma indizível e longa revelação ôntica; é a codificada suma das intuições e de iluminações, de poemas e de filosofemas espontâneos ou aprendidos na vasta gama que vai das formas de cultura e aculturação à inspiração pessoal do transmissor ou do rapsodo; e é o que traz ao presente os segredos antigos e restantes de velhas civilizações e culturas, modificados embora por um percurso semântico difícil de seguir, de capitular e de sistematizar, mas que nem por isso deixa de ser ou deve deixar de ser para nós uma verdadeira «carta de prego», lançada remotamente ao mar do tempo por viajantes desconhecidos, nossos irmãos. José Marinho, um dos poucos filósofos que, depôs de Oliveira Martins, Sampaio Bruno e Aarão de Lacerda, meditou entre nós a essência do mito, escreveu pertinentemente que «todo o poeta verdadeiro, todo o artista autêntico é filómito, e é-o necessariamente. Não há arte sem imagem, e se a imagem meramente virtual não se insere no mundo próprio dos mitos, a imagem simbólica insere-se sempre no mundo mítico». E isto porque o mito corresponde a uma experiência originária que o poeta não pode encontrar no círculo limitado da sua visão pessoal ou da sua existência social."


in Poesia e Filosofia do Mito Sebastianista

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Há duas histórias: a sagrada e a humana

"Importa sublinhar, antes de mais nada, que o mito implica uma fundamental distinção entre o sagrado e o profano. O mito é uma imitatio Dei, «uma imitação das gesta divinas», na expressão de Mircea Eliade. Inserido no mundo profano, o homem não tem verdadeira realidade enquanto não consagra os momentos essenciais da sua existência ao mito que os fundamenta e sustenta. Diz ainda Mircea Eliade que «o homem sé se tornou um autêntico homem, conformando-se ao ensinamento dos mitos, quer dizer, imitando os deuses[1]». Há duas histórias: a sagrada e a humana, tal como há dois tempos: o mítico e o profano. Mas a história humana e o tempo profano só adquirem realidade quando subordinados à história sagrada e ao tempo mítico, que lhes conferem carácter de eternidade. Esse carácter de eternidade é precisamente o que o homem religioso procura para transcender a evanescência e a morte. Daí que o mito exija actualizações cíclicas: os ritos.É indispensável neste ponto distinguir entre «essência do mito» e a sua «estrutura dinâmica e teleonómica», sempre unidas e complementares quando se trata de um verdadeiro mito, isto é, de um mito com raiz no sagrado e no numinoso
Adiantamos que a mitologia marxista ou materialista, exprimindo embora por transferência psicológica, a forma mais exterior do essencial mítico, só se identifica, no entanto, em plenitude, com a sua teleonomia. A sua dialéctica não é mais, efectivamente, do que uma substituição semântica; trata-se de um dinamismo teleonómico, em que as teses e as antíteses correspondem exactamente ao jogo de protecções e de obstáculos que encontra o herói mitológico na sua aventura sagrada, até se atingir, necessariamente, o cenário idílico da vitória dos deuses sobre os titãs, da fundação cosmogónica, da paz sem história, que constitui o «happy end» dos contos de fadas. (...)"

António Quadros
Poesia e Filosofia do Mito Sebastianista  (2001) pp. 350-351

[1] Mircea Eliade, «O Sagrado e o Profano (trad. Portuguesa)  Lisboa, Livros do Brasil, s.d.

sábado, 14 de julho de 2007

Sábado 14 de Julho - mais um excerto da obra de antónio quadros

O português quer viver, crescer e de um modo geral ser, mas afeiçoou-se a convicções negativistas, nomeadamente ao nível político e educativo, que o conduzem a um auto-envenenamento mental. É porque não acreditamos em nós próprios, no que somos e valemos, no nosso pensamento e na nossa cultura, que em vez de pensarmos a partir daí a renovação das nossas leis, das nossas instituições ou dos nossos sistemas, constantemente, em sucessivos remendos, nos limitamos a importar, a repetir, a copiar ou a adaptar, ao mesmo tempo que nos autocriticamos sem medida e nos negamos. Disse-o de uma forma lapidar Fernando Pessoa, num pequeno texto que por várias vezes tenho citado: «uma nação que habitualmente pense mal de si mesma acabará por merecer o conceito de si que anteformou. Envenena-se mentalmente.» Daí que, acrescentou, « o primeiro passo para uma regeneração, económica ou outra, de Portugal, é criarmos um estado de espírito de confiança – mais, de certeza, nessa regeneração.» Vivemos hoje um período de menoridade e de adolescência regressiva em que, predominando o intelecto passivo, as pessoas se auto-satisfazem e auto-iludem como os lugares-comuns ideológicos, com os discursos demagógicos e com as ideias convencionais de gerações que, para repudiarem um certo tipo histórico de nacionalismo, perderam a própria identidade e já não sabem quem são ou para que são, os portugueses. (…) devido ao cientismo e ao tecnicismos predominantes que o positivismo nos trouxe, sem o acompanhamento de uma educação do intelecto para o desenvolvimento das faculdades superiores do homem, o nosso ensino público dirige-se à mentalidade pueril, não logrando a elevação do intelecto passivo e adolescente até ao intelecto activo e adulto, o que explica a facilidade com que o estudante cai nas mais quiméricas, utópicas ou demagógicas ideologias, com pouca ou nenhuma capacidade de eleição ou de análise.(…).


Conferência proferida em 13 de Dezembro de 1983 subordinada ao tema geral “Que Cultura em Portugal no próximos 25 anos?"

14 de julho

14 de Julho de 1923 nascia em Lisboa

António Quadros

"Só há em mim perguntas sem resposta:


Instinto para amar, para durar,


A grande porta abrir-se-á um dia,


E tudo será noite, ou vida, ou luz..."

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Biblioteca António Quadros


A Biblioteca compreende actualmente cerca de 6000 títulos monográficos, cerca de 60 títulos de publicações periódicas, das quais de 15 são publicações estrangeiras.

sábado, 7 de julho de 2007

Movimento do Homem

"Estamos debruçados sobre o papel branco, como sobre o espelho labiríntico da nossa alma enigmática. Escrevemos, pensamos, libertamos inteiros compartimentos fechados, e logo outros escondidos e logo aqueles, invisíveis, de que jamais suspeitáramos. Existiam realmente, esses universos que o pensamento nos cria, a partir às vezes de uma imagem, de uma palavra, de uma sombra? Sentimos que nunca mais acabaremos, até ao último dia, até ao último minuto, até à última inspiração, de nos aproximarmos, de abrirmos novas portas, de descobrirmos novos espaços. Visitámos em Creta, o labirinto de Cnossos, o palácio onde o signo do labris, o duplo machado sacrificial, foi desenhado em cada divisão acrescentada ao projecto primitivo. Assim, sabemos que um labirinto não é uma série cifrada de corredores, mas uma imensa habitação que se vai construindo através dos tempos, aumentada e remodelada de geração para geração, sendo cada compartimento absolutamente necessário e funcional. Enganam-se aqueles psicanalistas que julgam ter encontrado o mecanismo secreto, a fotomontagem das almas. Uma alma, quando é explorada, penetrada, analisada, quando, sobretudo, se assume como reveladora do cosmos e representante infinitamente complexa do infinitamente grande, amplia-se, cresce, vai formando, lenta e incansavelmente, um corpo invisível, dia a dia maior, dia a dia diferente. (…) Assim, o papel branco do escritor é como a superfície cutânea, na qual um abcesso de fixação vai drenando o curso evolutivo do seu pensamento. O importante é que o canal nunca se feche, entre a elaboração conceptual e a expressão exterior. O importante é que o labirinto nunca se dê por concluído, nunca degenere em sistema circular, nunca se circunscreva num muro, nunca feche a última porta. (...)"

António Quados
O Movimento do Homem 
Sociedade de Expansão Cultural (1963)

quinta-feira, 5 de julho de 2007

dedicatória de antónio quadros em o «anjo branco anjo negro»

"Dedico estas breves histórias a Mircea Eliade, o Mitólogo, que do claro-escuro nocturno do seu pequeno jardim de cascais levou a minha infância à visão do maravilhoso possível a W. Somerset Maugham, o Contista, que numa tarde perdida de Lisboa me revelou a profundeza da intuição que pode haver sob a máscara irónica de quem suporta e vence um destino social a Álvaro Ribeiro, o Filósofo, que naquele assasinado café romântico do Rossio, onde os espelhos barrocos reflectiam ao infinito a imagem dos seres, pouco a pouco me ensinou a pensar como se o pensamento não fosse um absoluto, mas sim o homem pleno e movente, finitamente em busca de si mesmo a Salvador Dali, o Pintor, que na baía irreal de Port-Lligat, onde vogam cisnes e barcas de pescadores, reencontrei igual a si mesmo, sério, ardente e espectacular, fazendo da arte, não um fim, mas um outro elemento de viagem, luta e visão. à Mulher Eterna, fonte da vida, que no desenho do espaço e no ritmo do tempo, inlassàvelmente e com beleza se no momento excepcional, ensaia uma transcendência e invoca uma reintegração que do Homem esperam a palavra retardada e conclusiva."
"Olhamos para dentro de nós e apercebemo-nos que fomos pouca coisa, de que somos pouca coisa. Escrevemos livros, sobretudo um livro, montámos toda uma teoria de respostas satisfatórias para as nossas mais fundas interrogações, julgámo-nos senhores de um saber superior ao da maioria dos nossos amigos ou comtemporâneos, mas sempre a mesma pergunta contundente e inevitável. O que se encontra, meu Deus?"António Quadros, Uma Frescura de Asas

sexta-feira, 29 de junho de 2007

interrogar é já crer, a descrença humana não existe.
In ode à crença, 1996

segunda-feira, 25 de junho de 2007

domingo, 24 de junho de 2007

O tempo de Deus é o tempo da atenção. O tempo de Deus é hoje.

in, Histórias do Tempo de Deus.

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Poesia chorada, como o mar sob a chuva?
Poesia aflita, como um farol no denso nevoeiro?
Poesia angustiada, como a futura mãe?
Alegre o olhar, os meus dedos são mensageiros dos deuses
E cantam o que me sobra e eu não sei entender.
Alegre o coração, escapa-se de mim um fumo de dor,
E enquanto rio, sou também lágrimas e soluços.
O acordo é uma promessa do paraíso perdido mas não morto,
pois as suas portas choram por mim em mim.

o banquete infinito, antónio quadros
todos o sábados, no miniscente de luis carmelo escavações contemporâneas - o sorriso do arquivo no tempo da rede

Segundas- João Pereira Coutinho
Terças - Fernando Ilharco
Quartas - Viriato Soromenho Marques
Quintas - Bragança de Miranda
Sextas - Paulo Tunhas
Sábados - António Quadros (org. António M. Ferro)

quarta-feira, 20 de junho de 2007

Carta a António Quadros - João Bigotte Chorão
António Quadros - o perfil de um pensador, por João Ferreira

Trata-se de um dos mais ativos e produtivos escritores portugueses do século XX. Oriundo de uma família de intelectuais, teve em seu pai Antônio Ferro, amigo de Fernando Pessoa e editor do primeiro número da Revista “Orpheu” e na mãe, a poetisa Fernanda de Castro, incentivadores para uma avançada cultura, erudição e apego às letras. Nascido em Lisboa em 1923, freqüentou em sua juventude, a Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa onde ganhou o diploma de Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas. Sua trajetória de intelectual e de escritor, começou muito cedo. Foi um dos fundadores dos jornais de cultura Acto (1951), 57 (1957) e da revista Espiral. Tornou-se um dos diretores do Serviço e Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, sucedendo a Branquinho da Fonseca e a Domingos Monteiro com quem trabalhou desde o início deste serviço. Foi um dos organizadores e membro da primeira direção da Sociedade Portuguesa de Escritores.Como poeta, ficcionista, crítico, pensador, filósofo e cientista da cultura, cultivou com brilho a literatura de idéias. É claro que os arquivos da família Ferro, a Biblioteca Nacional de Lisboa, o Centro Nacional de Cultura, as editoras Europa-América, Lello & Irmão Editores e Publicações Dom Quixote, e os testemunhos dos membros ainda vivos do grupo da Filosofia Portuguesa e seus amigos intelectuais deverão ter ainda muitas memórias, informações e um rico arquivo bibliográfico para enriquecer sua memória. Apesar de estarmos longe dos arquivos lusitanos, vamos tentar agregar, mesmo assim, alguns dados ao alcance do nosso conhecimento para que não se prolongue por mais tempo na Internet o injusto vazio da memória desta grande figura da cultura portuguesa do século XX.