quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Um golpe profundo


"É (...) como ensaísta, sobretudo na área da filosofia e da exegese literária, que António Quadros se distingue e ganha notoriedade, sempre de uma forma discreta mas incontornável. (...) A sua intervenção ensaísta abrange ainda as excelentes introduções que escreveu  para livros como Clepsidra e Poemas Diversos e Contos, Crónicas e Cartas Escolhidas, ambos de Camilo Pessanha, Cartas Escolhidas e Obra Poética, de Mário de Sá-Carneiro, e para várias edições da obra de Fernando Pessoa. (...) Consciente do carácter efémero e perecível das vanguardas  António Quadros foi um dos mais perspicazes estudiosos das obras de Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Amadeo de Souza-Cardoso e Almada Negreiros. Com a sua morte, concorde-se ou não com as linhas mestras do seu pensamento, a cultura portuguesa sofre mais um golpe profundo."

José Jorge Letria
Jornal de Letras (1993)

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Pensar-estar


"Pensar não é uma parte de ser isolável das categorias ou acidentes da substância, isolável da estância, pensar participa também da estância. Não eu penso, logo sou; mas eu penso como sou e estou, ou como sou, estando; o meu pensar é um pensar-estar, por muito que seja um pensar, na filosofia, possuído da paixão de saber, que é paixão de ultrapassar as condições categoriais, de transcender o estar e atingir a substância, o que sub-está e daí o o que é e ultimamente O que é, o Ser sem relativo, a que os religiosos chamam Deus. Mas aos humanos só foi dado, só é porventura dado, pese à ilusão do progresso científico totalizante, um aproximar-se múltimodo, relativo, sempre distanciado, embora evolutivo, da verdade almejada. (...)"

António Quadros
A Filosofia Portuguesa, de Bruno à Geração do 57 seguido de o Brasil mental revisitado, extraído do n.º 42/43 (Julho/Dezembro 1987) da Revista Democracia e Liberdade).

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A sociedade dramática da existência

José Gomes Ferreira

"Leonardo Coimbra levou-me à Brasileira do Rossio (...) fez-me descobrir, graças à sua eloquência de lágrimas nos olhos, a sociedade dramática da existência. Mas teve acima de tudo esta extraordinária virtude pedagógica: a de me ensinar o contrário do que pretendia, confiando talvez demais na sedução espectacular do seu verbo entusiástico e persuasivo. Mas o destino arma-as e eu, já aos 20 anos, chegara a conclusões totalmente diversas das dele. Quer dizer: ensinou-me a ser livre. E é, no fim de contas, este gosto a liberdade, em mim sempre ligado à ideia do Liceu Gil Vicente, que mo torna tão grato e tão querido."

José Gomes Ferreira 
Boletim dos Antigos Alunos do Liceu Gil Vicente

Um poema de Luís Amaro

Aprendizagem

a António Quadros 
e Azinhal Abelho


Da morte quero conhecer o sentido profundo,
para melhor compreender
a vida que me deram
e o mundo.

Palpar a morte, ouvir
sua mensagem secreta, inviolável...
Com ela estremecer,
cheio de pavor e amor!

Um morto quero ver
a diluir-se em nada,
a libertar-se do nada
que foi no mundo...

A morte, sim, pretendo conhecer,
e com ela vibrar
e com ela chorar
flageladoras e reveladoras lágrimas...

- Para depois melhor poder viver
e aceitar então, sereno e calmo,
aquilo que o destino me trouxer.

Luís Amaro
Diário Íntimo | Dádivas e Outros Poemas
(Editora Licorne, 2011)

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

"Viajar em auto é correr mundo a cavalo num relâmpago.", Teixeira de Pascoaes

Teixeira de Pascoaes

Via Associação Amarante Automóveis Antigos,  aqui.

Teixeira de Pascoaes com Frederico e Guilherme Pereira de Carvalho

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

A Capital, 12 de Novembro de 1915

A Capital, 12 de Novembro 1915

Inesgotável

"A filosofia mostra-nos que seria absurdo acreditar que um dia esgotaremos o que é pensável, o que pode ser feito e formado, da mesma maneira que seria absurdo colocar limites ao poder de formação que jaz sempre na imaginação psíquica e no imaginário colectivo sócio-histórico."

Cornelius Castoriadis
"En mal de culture", Esprit (Outubro  de 1984) 
publicado em  "A ascenção  da insignificância" , Editorial Bizâncio (2012), p. 229.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Lembra um Sá-Carneiro que escrevesse romances...



"Romance de inspiração surrealista, mas muito mais "lógico" do que outros livros do autor, em que, (...) Ruben A. mostra a cisão natural da alma humana, dividida entre personalidade que por vezes se afrontam.  Lembra um Sá-Carneiro que escrevesse romances."

António Quadros
(fichas de leitura para o departamento de aquisições da Fundação Calouste Gulbenkian)

O predominante do legado

"O predominante do legado de António Quadros é a leitura filosófica da literatura portuguesa, género em que se encontrou sozinho, por não haver mais ninguém orientado para idêntico método."

Pinharanda Gomes
"António Quadros e a existência literária portuguesa" em
 Revista Colóquio/Letras. In Memoriam, n.º 131, Jan. 1994, p. 197-198.

sábado, 8 de dezembro de 2012

Os dois Portugais

"O trágico equívoco português foi a cisão dos elementos tradicionais e dos elementos dinâmicos na sua personalidade, cisão a partir da qual surgiram os dois Portugais, distintos e nenhum verdadeiro."



António Quadros
"A Arte de Continuar Português" em Portugal a terra e o homem: antologia de textos de escritores do séc. XX por David Mourão-Ferreira e Maria Alzira Seixo, Fundação Calouste Gulbenkian, 1980. Disponível aqui.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

"Viagens, História e Poesia em Livros para Crianças"


"Talvez por ser filho de uma das escritoras portuguesas que com maior talento, vocação e imaginação cultivaram o género, Fernanda de Castro, há muito que me interessa ou mesmo apaixona toda a problemática da literatura oral e escrita para crianças. (...) Tinha 5 anos quando Almada Negreiros fez para mim uma aguarela com um grande cavalo de circo pintalgado e com uma bela acrobata, que me acompanhou durante toda a vida e que continuo a ter em minha casa, todos os dias debaixo dos olhos. (...)"

 António Quadros 
Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas, Boletim Cultural
VI Série, Nº 4, Março de 1985, disponível aqui.

Ferrer-Correia, Orlando Vitorino e Robert Gulbenkian

António de Arruda Ferrer-Correia, Orlando Vitorino e Robert Gulbenkian no 25º aniversário do Serviço de Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian. Fonte: Boletim Informatvo da FCG VI Série, nº 4, Março de 1985.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Filosofia Portuguesa?

"Sei que apesar da estranheza do que me era dado a ler, e sem compreender em profundidade muito do que estava a ler, eu admirava a convicção das ideias, a amplitude das referências, a densidade dos argumentos. Exclamando pouco depois a minha admiração entre gente que eu acreditava mais sábia em virtude das letras das canções que dedicavam à democracia, logo ali mesmo me calaram com o argumento de aquele era discurso desprezável. Filosofia Portuguesa, diziam, acrescentando a deseronra do seu esoterismo e até a sua associação à ditadura. Engoli envergonhado a crítica feroz aos meus gostos desviantes, sufoquei a leitura de António Quadros e tentei manter-me na linha ideológica correcta. Mas aquele episódio veio inevitavelmente à memória quando alguns anos mais tarde, amadurecido pelo erlebnis da História portuguesa, acabei finalmente por reconhecer que se à direita a coisa continuava a enrufar-me, à esquerda a vida intelectual estava afinal pontilhada de ignorantes compulsivos. A vida e a academia fizeram-me entretanto crítico literário e ensaísta. Voltei à leitura de António Quadros, e em 1989 deparei com uma das mais perspicazes abordagens da literatura de que eu tantas vezes falava sem conhecer alguma da sua natureza mais subsistente. Intitula-se A Ideia de Portugal na Literatura Portuguesa dos últimos 100 anos. (...)"

Manuel Frias Martins
 António Quadros,18 anos depois 
Fundação António Quadros (2011)

«Reflexão à Margem da Literatura Vieirina» | Rui Lopo

Padre António Vieira

"António Quadros é um dos intérpretes da nossa cultura que mais pautou o seu labor por uma fixação esquemática de autores e correntes de acordo com categorias que lhes são exteriores, em esquemas determinantes e integradores, isto é: genealogias e linhagens. Assim, segundo o autor de Introdução à Filosofia da História, o providencialismo é a grande tradição de interpretação da história portuguesa, radicada em Paulo Orósio. Quadros detecta-a não só nas filosofias da história de nítido recorte teológico e de assumida radicação providencial, augustiniana e orosiana, mas também nos modos de pensar que classifica como afirmativamente imanentistas, onde se inscreveriam diversos modos de pensar a história portuguesa de tipo igualmente teleológico, como que laicizando as escatologias e as teleologias providenciais. (...) Para Quadros, o problema de Vieira não é a assunção de uma escatologia, de um providencialismo, ou de uma teleologia lusocêntrica, a questão é perspectivar o Quinto Império não como uma verdade revelada mas como uma verdade fáctica, evidente e subsistente: uma verdade em si mesma fundada. 

Confundiu Vieira o possível com o provável, o tempo real com o ideal, a realidade com o seu eschaton ou fim último, o profético com o divino. A sua admirável retórica, a sua prosa riquíssima onde surgem aliás numerosos acertos e profundas intuições implica uma sofística que não podemos ocultar. (António Quadros, Introdução à Filosofia da História, Lisboa, Ed. Verbo, 1982)

Quadros remete para a liberdade divina e para a liberdade humana como instâncias que deverão relativizar a pretensão humana a conhecer e racionalizar o exacto conteúdo dos tempos futuros, preservando todavia o profetismo, o providencialismo e o pensamento de tipo teleológico e mesmo lusocêntrico. Aliás, a crítica que Quadros faz a Vieira é o preço a pagar pela manutenção do seu estatuto como profeta e arauto do Quinto Império e da necessária mediação de Portugal para o advento do Reino de Cristo na Terra Consumado. 

Rui Lopo
Texto apresentado no Congresso internacional 
Padre António Vieira. Ver, Ouvir, Falar: O Grande Teatro do Mundo
18-21 Novembro 2008, Lisboa, disponível também aqui.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Terra-pátria

"O nosso mito é o da fraternidade humana que vai buscar a sua raiz à nossa terra-pátria."

Cornelius Castoriadis

domingo, 2 de dezembro de 2012

Ardentes e sinceros

"Sejamos todos nós, escritores e artistas, ardentes e sinceros missionários da verdade mais vitalmente profunda que soubermos conquistar pela beleza das palavras e das imagens."

António Quadros
A Existência Literária (1959), p. 36.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Fidelidade essencial

"Quando Fernando Pessoa identifica a pátria com a língua e não a língua com a pátria está proclamando a sua fidelidade essencial ao espírito, e não às manifestações mais terrenas e contingentes que são as nações e as sociedades." 

 António Quadros

E se pulássemos?

Sampaio Bruno

"E se pulássemos, caro amigo? Sossegue; coisa pouca. De ocidente a oriente; de este a oeste, como quem dissera de norte a sul, de polo a polo, de nadir a zenit. Mas, em espírito, entende-se. Outramente não o consentem nem a majestade da sua pança nem o respeito pela assistência, que nos contempla, escarninha. Mas é que, havendo-lhe falado do novelista espanhol Galdós, cuido que por um processo natural me acudiu ao espírito o nome do romancista russo Dostoiewsky (...) Qual o motivo desta evocação do russo? Que afinidades ao ibero prendem o salvo? Pensando nisto, après coup, julgo que foi a vibração actual de uma releitura a que volvi com íntimo sobressalto. É um absurdo de talento que pertence ao livro [«Esfinge e Realidade» de Benito Pérez Galdós], que excede o poder da atenção, direi de compreensividade, das turbas aglutinadas em banquetes de espectáculo. (...) Composição estranha! Agita-a um bafo morno de loucura raciocionante."

Sampaio Bruno
Notas do Exílio, (1893), pp.45-48

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Decomposição e Renascença

"A metáfora bíblica do rebanho assenta bem num povo cujas melhores virtualidades se guardam ainda no ambiente rural, que até em muitas cidades subsiste, quase ignorado. Nem sempre houve esta dicotomia entre o citadino e o rústico, mesmo em Lisboa, cujos bairros mal disfarçavam as origens campesinas dos vizinhos. Compreende-se, por isso, que a Restauração de 1640 se tivesse travado entre Vila Viçosa e a capital, pólos complementares de um País unido no mesmo impulso libertador. (...)"

Joaquim Domingues
«Decomposição e Renascença»,
Diário do Minho, republicado aqui.

Razão pura


"A possessão da natureza só ficará plenamente justificada, só se tornará inteiramente possível e só atingirá a finalidade que, por intermédio da ciência, se propôs e nos nossos dias parece já ter alcançado, quando a natureza se afigurar ao homem como mundo de ilusão e da fábula, mundo portanto sem realidade, sem essência nem necessária existência, mundo de formas e corpos que, em si inertes e sem vida, são movidos por forças que em si próprios não contêm mas lhe são alheias e extrínsecas e não neles, mas só no pensamento abstracto ou do que chegará a chamar-se «razão pura», revelam seu segredo. (...)"

Orlando Vitorino
Refutação da Filosofia Triunfante, (1976) pp. 63-64

Teoremas de Filosofia



"Ninguém está preparado para aceitar o absurdo."

Afonso Botelho
O Toiro Celeste Passou (1963), p.44

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Regresso de Fernando Pessoa


"[Fernando Pessoa] toma a decisão da sua vida: regressar a Portugal, de onde partira com 8 anos, deixando a mãe, o padrasto e os irmãos na África do Sul e arriscando-se a viver num meio que lhe é praticamente desconhecido. Assim, em Agosto de 1905, com 17 anos, parte para Lisboa, para se matricular no Curso Superior de Letras. Quais os motivos desta decisão, que deve ter sido dramática para um homem da sua sensibilidade? Não será difícil conhecê-los e compreendê-los. Sozinho com a mãe, depois do desaparecimento do pai e do irmão, sobre ela terá projectado toda a sua afecticidade e dela ao mesmo tempo terá recebido o amor exclusivo que as suas carências infantis exigiam. Mas o segundo casamento, a mudança súbita de vida, a difícil integração num novo lar que não terá sentido como inteiramente seu, o nascimento, um a um, dos irmãos, que decerto mobilizaram a maior parte da atenção, do carinho e até do tempo da sua mãe, também partilhados com o padrasto, que tomava o lugar do pai, tê-lo-ão acossado à solitude e à mágoa insatisfeita de que dá testemunho a sua poesia do Cancioneiro. (...) Uma das grandes linhas de força da personalidade e da obra de Fernando Pessoa, o sentimento patriótico, mergulha efectivamente as suas raízes emotivas nessa múltipla saudade: saudade do pai, saudade do lar e da família em que "ninguém estava morto", saudade da Pátria onde fora feliz, onde ficara o Pai e com o Pai se lhe identificaria pouco a pouco a sensibilidade, na imaginação, na memória inconsciente. (...)" 

 António Quadros 
Bruxelas, Junho de 1989

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Daquilo que dizemos

“Não é a língua que é a pátria, mas sim aquilo que dizemos”.

 Jorge Semprúm 
 A Escrita ou a Vida (ASA,1995)

Meu caro Ângelo

"Nesta terra de analfabetos e homens de letras, em geral muito abaixo dos analfabetos, os que pensam com dor e profundeza, os que sentem pensando e passam sentindo, passam ignorados ou mal conhecidos pela parte episódica da sua vida. É assim que todo o meu labor filosófico, todo o meu trabalho emotivo, ainda há pouco, você o sabe, foram esquecidos para me emprestarem nos jornais uma fisionomia de político, com amigos políticos ( votos?! ) e tudo. Isto tem o seu lado trágico: bem mostra como é difícil inscrever no espaço ( «objectivar», em linguagem filosófica ) a verdadeira máscara da nossa intimidade. Já pensou, meu amigo, como somos diferentes na apreensão alheia e como na opinião que os outros de nós fazem é a mão brutal da fatalidade a deformar o modo essencial do nosso ser? A flor da consciência é a mais trémula e hesitante, mal pode abrir as melindrosas pétalas no vendaval que a brutaliza. (...)" 

 Leonardo Coimbra em carta a Ângelo Ribeiro, 

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Uma Faculdade toda ao contrário

"De vez em quando sucedem milagres, se Deus os consente e neles se empenham os homens. Num país de ensino rotineiro, com mais interesse pela nota e pela autoridade do catedrático do que respeito pela ciência e liberdade de discernimento pessoal, surgiu a Faculdade de Letras do Porto, que era toda ao contrário, inimiga da burocracia e fosse do que fosse que pudesse lembrar Coimbra e seus malefícios de séculos e incitadora de descoberta própria mais do que de aprendizagem febril, bem longe de ser a escola técnica de profissionais de ensino em que se transformaram as outras." 

 Agostinho da Silva 
"Alguma nota sobre Casais"
Cadernos de Filsofia Literária, Araraquara, São Paulo (1974)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Centenário do nascimento de Luigi Panarese (1912-2012)



Licenciado em Filologia Moderna pela Universidade de Nápoles, Luigi Panarese foi um destacado vulto dos estudos luso-brasileiros do século XX e o primeiro tradutor de Fernando Pessoa em Itália. Mais sobre Panarese aqui


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O mais alto e o mais perfeito modo de liberdade

"A vida é digna de ser vivida na plenitude integrante ou reintegrante de cada acto, desde que se assuma o conceito de que o amor é o mais alto e o mais perfeito modo de liberdade." 

António Quadros

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Sentido, lógica...justificação?


‎"Reencontrará o Estado português o seu sentido, a sua lógica e a sua justificação? (...) Terá a grandeza de estimular discretamente e sem exigências de pagamento os nossos pensadores e personalidades criadoras, em vez de os marginalizar por razões políticas, universitárias ou outras?"

 António Quadros

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Ser português é uma filosofia

"Compreendi que, para pensar a existência, devia assumir e desposar os modos de existência que me eram próximos e palpáveis. Ser português era a categoria metafísica da minha raiz. A partir daqui cresceria a minha árvore ou outra opção não teria senão o destino de líricos ou historiadores que vem sendo fado de tantos dos que entre nós se dedicam ao pensamento.
(...) Ser português é, desde logo, uma forma de comunicação do homem com o mundo. Ser português é um pensamento. (...) É uma filosofia. (...)"

António Quadros
"A Cultura Portuguesa perante o Existencialismo"
em Sartre e o Existencialismo de Ismael Quiles
(Arcádia, 1959), pp. 30-31

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Será ainda o transporte do coração

"Se é um salto no vazio, será ainda o transporte do coração, onde em amor e saudade vivem todas as realidades que deixou, é a partida da memória, que guarda todas as imagens do real e será sempre, e pelo menos, a sua vida de lembrança, o seu exílio de saudade.
Mas os que, de olhos fechados, se abrigam de pronto no regaço divino, só poderão levar na rasgada pupila de sua memória o inútil esforço de povoar a irremediável solidão, donde fugiram. (...)"

Leonardo Coimbra
A Razão Experimental (1923) p.13

Como o desaparecimento da vida

"O que é a consciência que se afirma no juízo, se liberta na memória e aparentemente se apaga como o desaparecimento da vida em que se insere?"

Leonardo Coimbra
A Razão Experimental (1923) p.376

Tanto desconhecido

"Tanto desconhecido carregando no pensamento sonhos de ambição ou de humildade, como na minha pátria, como no resto do mundo, e, para lá dos sonhos de superfície, a mesma consciência religiosa de se ser homem e querer amar e entender a vida (...)"

Leonardo Coimbra
A Razão Experimental (1923) p.13

domingo, 9 de setembro de 2012

"O mito coloca-nos na atitude espiritual correcta."

"No discurso popular, o mito é normalmente entendido como mentira. Um político, se for acusado por um pecado do seu passado dirá "é apenas um mito." (...) Mas no mundo pré-moderno as pessoas sabiam que uma história mítica não tinha nada a ver com a História. Era mais do que História. Contava o significado do que aconteceu, o significado oculto do que aconteceu. Para além disso [o mito] era uma verdade intemporal. (...) Uma boa definição do mito é uma coisa que num certo sentido aconteceu uma vez, mas que também acontece a toda a hora. Um aspecto importante a reter acerca do mito é que não faz sentido a não ser que seja colocado em acção. ´(...) O mito coloca-nos na atitude espiritual correcta."

Karen Amstrong
Excerto de uma entrevista para o programa 
O Tempo e o Modo exibido na RTP2 em Junho de 2012

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Do movimento

"Quantos mundos, melhores dotados do que o nosso, alcançaram já de todo a sua liberdade; quantos findaram já, ao menos, o drama da sua paixão; a quantas consciências ascendentes seria dado o expiar de seus trabalhos, quando o homem ainda só a meio da montanha é que rola o bloco enorme de sua culpa! Espirito atenuado porquanto derivado tempo ainda?! A alma individual desfaleceu e abateu. Quem sabe se avançou?"

Sampaio Bruno
A Ideia de Deus (1902) p. 480

Em sinal de luto

Sampaio Bruno

"Nada me demoveu. Fui inabalável. Não estou arrependido. Abandonei a política para sempre. Mas deixei crescer as barbas, em sinal de luto. Grandes barbas semeadas de cãs, a forma que encontrei para todos se lembrarem, ao cruzarem-me na rua, da minha mágoa por um regime que ajudei a implantar, mas que tendo-se desviado do caminho certo, seguia por atalhos precários e perigosos."

António Quadros
com Sampaio Bruno na primeira pessoa
em Uma Frescura de Asas (1990) p. 114

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Leonardo por Fernando Pessoa

"Nunca haverá em mim entusiasmo que eu sinta que me baste perante o panorama de alma que é a sua obra. O abarcar tanto com a inteligência, o descer tão fundo no sentido possível das coisas - tudo isso representa em Portugal uma novidade para ser acolhida com uma alegria estremunhada."

Fernando Pessoa
em carta a Leonardo Coimbra
(1913)

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Invasão

"A sociedade possessiva invadiu o domínio imaterial das ideias."

António Quadros
Franco-Atirador, (1970), p.134

Do mito

"O homem age inconscientemente, os seus gestos inscrevem-se em inércia, visto que o movimento real é o mito."

António Quadros
Introdução à Filosofia da História 
(1982), p. 227

Pruridos

"Nunca os teorizadores de uma filosofia portuguesa ou de uma filosofia de língua portuguesa pretenderam afirmar uma sua existência positiva com finalidades de enaltecimento nacionalista e restrictivo, e muito menos criar uma tradição filosófica para satisfação de pruridos autolátricos, castiços ou aristocráticos."

António Quadros
O Movimento do Homem
(1963), p. 317

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Do amor

"Tenhamos sobre nós a disciplina que se origina não do medo dos coronéis, mas do amor e da apetência das cavalarias que aí vêm. Se renunciarmos, o faremos, não por falta de paixão, mas porque outra mais alta nos prendeu. Aprendamos a reunir o abandono que nos descansa com o tenso esperar do momento de acção. Tratemos o nosso corpo com o cuidado amor do atleta que se prepara, e façamos dele o perfeito instrumento para que cumpramos o nosso primeiro dever: o de durar."

Agostinho da Silva
Revista «Espiral», 8/9 (dir. de António Quadros), 1965.

Religioso ou laico

"Religioso ou laico (...) que haja movimento do homem e que este não seja apenas positivo, material e técnico."

António Quadros
Jornal 57, nº 7, Novembro de 1959

domingo, 2 de setembro de 2012

Da razão social

"Não sabemos se há Deus? Não temos um critério de verdade que digira os nossos actos? Procedamos como se Deus existisse, como se o Estado fosse justo, como se a razão pura tivesse em si a garantia de uma autenticidade. Por outras palavras, e encarando o problema do ponto de vista político: como se o maior número, ou a razão social, constituíssem o selo da verdade; como se o super-homem, ou a razão da vontade, justificassem o direito pela própria virtude da vontade mais forte; como se o indivíduo, ou a razão psicológica fossem justificados em fazer prevalecer, contra o mundo, a superioridade do «ego»; ou ainda como se um futuro ou a razão histórica constituíssem critério para o drama dirigido do presente."

António Quadros
A Existência Literária (1959), p.118

domingo, 29 de julho de 2012

Dalila Pereira da Costa

"Juntei quase todos os seus livros. Leio-os reiterada e irregularmente. Imprescrutáveis, porque é o coração a ditar o fluxo vital do pensamento, o espírito a fazer sentir a possível alma, a poética como forma única de expressão do indizível. Impossível surpreendê-la. (...)"

José António Barreiros

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Completamente livre

Leonardo Coimbra
“O espaço humano começa com o pensamento dogmático, que é a religião e termina no pensamento completamente livre, que é a arte.”

Leonardo Coimbra

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Modo de ser em sociedade e no mundo

"Talvez a última palavra nos pertença, a nós, portugueses, se soubermos quem somos e para que somos, não tanto à luz de uma vontade de afirmação nacionalista quanto à de um modo de ser homem em sociedade e no mundo."

António Quadros
Portugal, Entre Ontem e Amanhã
(1976), p.309

sábado, 30 de junho de 2012

Por Deus ou contra Deus

"Como se sabe a questão da sua [de Leonardo Coimbra] "conversão" à Igreja Católica ainda hoje abre lugar a ser questão, num mundo binário em que se é por Deus ou contra Deus. É que, estando em presença de um ser tumultuoso, aquele encontro sacramental com o Padre Cruz, seu confessor, não é que pudesse ser parte de um caminho cuja trajectória viesse a alterar; é que nunca seria nele a vulgar submissão ao que muitos se vergam, a dogmas tidos por intemporais, a catecismos de discutível vigência, à pobreza da prática ritualista e suas ladainhas sem o exaltado orar da plenitude do coração. (...)"

José António Barreiros
continue a ler aqui.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

No dia da aclamação de D. João IV

"Incansavelmente, nas agruras do exílio e da miséria, D. João de Castro estuda as Trovas [de Gonçalo Annes Bandarra], interpreta-as com fina casuística, ajeita-as ao seu sonho de desesperado: o Bandarra previa não só a catástrofe, mas também a salvação. É que D. Sebastião nem morrera nem poderia ter morrido! Era o pobrezinho calabrês perseguido, naturalmente, pelos grandes da Terra, ciosos do milagre que tal sobrevivência já representava e das proezas que o «rei» teria de levar avante... É um sonho espantoso pela intensidade e pela duração, documentado pelas páginas que intensamente escreveu. (...) Com a sua morte, o sonho sebastianista de D. Sebastião propriamente dito, em sua pessoa redivivo, desvanece-se aos poucos.
Mas eis que, em 1624, Manuel Bocarro publica Anacephaleosis da Monarquia Lusitana, logo apreendida e perseguido o autor. É que, bem consideradas as coisas, o Encoberto seria, afinal, o duque D. Teodósio, da poderosa Casa de Bragança! Depois, falecido o duque, sem que tivesse havido ensejo para que se descobrisse como quem era, as trovas do Bandarra, bem interpretadas, o que anunciavam, isso sim, era o fim do domínio castelhano e a entronização do restaurador D. João IV!
Segundo assevera João Lúcio de Azevedo, então «as Trovas eram livro que em cópias manuscritas andava em mãos de toda a gente, lido, relido, decorado e discutido.» Eram como que a consagração sobrenatural dos feitos da Restauração: pois, no dia da aclamação de D. João IV, não estivera exposta na Sé, como se de um santo se tratasse, a imagem do Bandarra? (...)"

Joel Serrão
Do Sebastianismo ao Socialismo em Portugal 
(1969) pp. 15-16.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Quantos manuscritos...

"Perdi a conta de quantos manuscritos passei à máquina da sua vasta obra literária. Eram verdadeiros puzzles de letra miudinha que, com todo o empenho, reverência e admiração, decifrava. Em 25 anos de proximidade diária, quantas vezes não lembro o carinho (e inconfessado orgulho) que punha nesse contributo para uma obra tão extraordinária..."

Pilar d'Orey Roquette 
(assistente de António Quadros)

terça-feira, 26 de junho de 2012

Bruno e A Questão Religiosa

Sampaio Bruno

"(...) situo o volume de Bruno sobre A Questão Religiosa, surgido na fase amadurecida do combate iniciado em 1872, no Diário da Tarde, e prosseguido na Análise da Crença Cristã, de 1874. Homem que não dissociava o pensamento da acção, tinha no entanto a humildade e a lucidez para arrepiar caminho quando tomava consciência de ter errado, como foi o caso daquele livro juvenil – “má coisa” lhe chamou –, assim como de outras páginas, escritas sob a emoção dos acontecimentos, por quem não era o frio jornalista profissional, mas, como confessou, um sectário das suas convicções. Aliás, o ambiente social era propício ao exacerbar de atitudes, ao romper de laços, numa generalizada conflitualidade, onde era assaz difícil definir campos estáveis.
Compreende-se, assim, que, não obstante as contundentes afirmações feitas acerca da Igreja, de alguns dos seus representantes ou atitudes, José Pereira de Sampaio contasse entre os amigos vários sacerdotes de valor. Entre eles o P.e José Agostinho de Oliveira, polígrafo hoje pouco lembrado, cuja poesia mereceu os elogios do lusófilo Philéas Lebesgue e que, entre muitos outros trabalhos, redigiu os dois volumes complementares da tradução portuguesa da História de Portugal, de Henrique Schaffer, projecto acarinhado, mas não levado a cabo por Bruno. Ainda em vida do filósofo, José Agostinho publicou o primeiro estudo autónomo acerca do seu pensamento, já então definido nas suas linhas mestras. (...)"

Joaquim Domingues
Continue a ler aqui.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Aniversário

Este blogue faz hoje 5 anos.

Do ser filósofo

"Será já excelente conseguir que o ensino de filosofia a vários graus não impedisse ser filósofo a quem nasceu verdadeiramente para o ser."

José Marinho
Filosofia, ensino ou iniciação?
(1972), p.93.

terça-feira, 19 de junho de 2012

A actividade simbólica da criança

"A psicologia das pessoas é mais qualificável que quantificável. A inteligência, por exemplo, é qualitativa. Isto é um princípio que me parece fácil de deduzir (..) A inteligência que me interessa é a que aparece como uma qualidade, sentida por mim em termos de afecto e não de quantidade. Dito de outra forma: na orientação escolar, por exemplo, parece-me mais importante avaliar as funções do imaginário da criança, saber em que medida esse imaginário se liga ao concreto das experiências da escola e da vida.
Em conclusão, interessa-me mais apreciar a actividade simbólica da criança e a sua capacidade criativa, do que conhecer a sua capacidade quantificável, de aquisições teóricas."

João dos Santos
Em entrevista ao Diário de Notícias
(4-11-1984)

Ensino

João dos Santos
"Se Pascoaes pôde ultrapassar o fracasso do seu exame de português, quantos não baqueiam perante as dificuldades criadas por um sistema de ensino que se lhes não adapta?"

"Usam-se testes para determinar a memória, a atenção, a inteligência. Não se está em contacto directo com a criança. Há sempre uma barreira feita de preconceitos científicos acerca do que é a afectividade."

"O ensino não pode continuar a transformar o meio de apreciação dos resultados - que são a pontuação e a passagem de classe - no seu próprio objectivo!"

João dos Santos
(médico e psicanalista)

Reforma do ensino

"A reforma do ensino deve começar nas maternidades."

João dos Santos
(médico e psicanalista português)

Do princípio do que pensa

"Que é pois a inteligência, que é a razão, qual a estranha origem, qual a natureza, ou mais propriamente o princípio do que pensa, não enquanto ser que pensa mas equanto pensamento no que pensa?"

José Marinho
Filosofia, ensino ou iniciação? 
(1972), p.76.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

"Uma das obras mais vivas e pertinentes do pensamento crítico actual"

Taborda de Vasconcelos

"António Quadros vem (...) para A Existência Literária, menos atraído ou dominado agora pelo gosto, talvez um tanto ou quanto gratuito, da literatura e particularmente do romance que pelas determinantes duma formação cultual processando-se ao contacto dos problemas mais agudos do ambiente português dos últimos anos. Não dominado, no sentido linear do termo, mas instruído de uma teoria, de um ponto de vista filosófico-literário, ele actualiza o que antes fora puro conhecimento vivo da matéria literária, reduzida a uma época pretérita embora com irradiação futura, mas sem aquele sentido de profundidade que uma noção metafísica, digamos, hoje, lhe atribui.
Ainda que útil e benéfico, como experiência e iniciação, Modernos de Ontem e de Hoje marcam uma fase já ultrapassada. Demais, o tê-la vencido e continuado, só prova o quanto havia de potencialmente polémico na essência dialéctica dos seus ensaios. Provam-no também na gravidade pensada da linguagem que usa em Existência Literária, lógica e sincopada, amplificando, por outro lado, o da criação duma supra-realidade, o pensamento do seu autor, até às mais largar proporções humanas e gerais.
Num estilo severo e contido, dá-nos assim António Quadros uma das obras mais vivas e pertinentes do pensamento crítico actual, ao mesmo tempo que faz coincidir os vários passos do seu itinerário espiritual e artístico com a mais perfeita e acabada unidade dele mesmo."

Taborda de Vasconcelos
"Existência Literária" em Regresso à Inteligência
 Porto, 1962, pp. 105-109.

sábado, 16 de junho de 2012

Coelho Pacheco

"Na nossa troca de mail's em Novembro, alertei-te para o facto de um dos heterónimos na tua lista, C. Pacheco, ter uma neta de carne e osso, Ana Rita Palmeirim, que é actual detentora da obra literária do avô. Ou seja, o tal C. Pacheco que escrevia poemas era o mesmo José Coelho Pacheco que foi amigo de Pessoa. A teu pedido, enviei-te o artigo do JL em que Teresa Rita Lopes revelou essa informação. Qual não foi o meu espanto quando, na edição portuguesa do teu livro, vi que C. Pacheco continua a figurar como heterónimo e com a mesma caracterização que lhe tinhas dado na edição brasileira. No final, sim, acrescentas a nova informação, admitindo que "provavelmente" (!) o C. Pacheco corresponderia a José Coelho Pacheco. Mas então por que razão não o retiraste da lista?
Este é um procedimento demasiado frequente no teu livro. Vais apresentando histórias sobre Pessoa que "provavelmente" serão falsas, mas só no fim mencionas, em jeito de nota de rodapé (e, por vezes, exactamente numa nota de rodapé), o seu carácter lendário ou implausível. (...)"

Richard Zenith
Q, Diário de Notícias
16 de Junho de 2012

terça-feira, 12 de junho de 2012

Luís Filipe Castro Mendes vence Prémio António Quadros

Lendas da Índia de Luís Filipe Castro Mendes

Leia a notícia aqui.

"GLOSA A UNS VERSOS DE NEMÉSIO"

Se com quase quarenta anos mal começa,
ovo de tanta coisa, o coração,
que direi hoje, com quase sessenta anos?


Que névoa fria cerca agora o coração
e que voz de dentro resiste a essa névoa,
pois o amor não pára enquanto continuar
o mundo?


Abre os olhos, meu amor:
o mundo é vasto e diverso e brilha
por entre a névoa mais densa.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

No abismo do mistério

‎"No abismo do mistério uma luz brilha de inalterável claridade, é o dever."

Leonardo Coimbra

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Esforço de imortalidade


"Esta vida só pode ser deixada, quando, penetrada, de universal vontade amorosa. (...) Do nosso lado continuamos o esforço de imortalidade, apoiamos o desejo de ser que por ventura anime os desaparecidos - a nossa recordação, a memória, é o alimento que lançamos a essa fome, o óleo derramado sobre essa pequena chama para que seja clarão, incêndio inextinguível."

Leonardo Coimbra
A Luta pela Imortalidade
(1918), p. 179

Delíquio

"Como sentimos o delíquio da nossa personalidade, pensamos por vezes que um panteísmo niilista nos absorve; mas não é a diminuição da consciência, é o seu desapego das vulgaridades interessadas e a sua expansibilidade, a sua universalização que nos elevam."

Leonardo Coimbra
A Luta pela Imortalidade
(1918), p. 167

No mistério imenso que nos cerca

"No mistério imenso, que nos cerca, nada de definitivo e em definitivos termos podemos afirmar senão a conexão dos fenómenos."

Leonardo Coimbra
A Luta pela Imortalidade
(1918) p.134

Da liberdade

"A filosofia como órgão da liberdade é pesquisa teórica e mais ainda atitude prática: a libertação do comportamento, do sagrado das prescrições imperativas e a sua norma pela autonomia do querer. A reflexão filosófica é o desenho virtual da autonomia da vontade, pois que o acto não é mais que a realização da ideia,sua forma virtual."

Leonardo Coimbra
A Razão Experimental (1923) p. 30.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Biogr. Kamenezky


Teresa Rita Lopes recebeu nova comunicação de Álvaro de Campos – que se apressa a dar a conhecer.

Eliezer Kamenezky
A revelação-mor da sua “Quase-autobiografia” pessoana, faz questão de realçar Cavalcanti Filho, é a de que Elieser Kamenezky é um novo heterónimo de Pessoa, a acrescentar ao de José Coelho Pacheco e Padre Matos, entre outros que inegavelmente existiram como António Botto e Mário de Sá Carneiro e – revelação ofuscante! – D.Sebastião!
No prefácio que fez ao livro de poemas de Eliezer Kamenezky, Alma Errante, em 1932, o Fernando tem o cuidado de aconselhar o leitor a que os leia “sem Grécia, isto é, sem estética nem metafísica” nem “preconceitos estéticos” porque “são infantilmente sinceros – têm uma poesia própria, independente da poesia que é propriamente poesia”. Está tudo dito: não são poesia a valer. Jamais Pessoa assumiria qualquer dos seus versos. Que papel terá tido nesse livro? A rogo do judeu russo, seu amigo - que estaria tão empenhado em legar livros à posteridade como o nosso Biógrafo a decisiva biografia de Pessoa! – ter-lhe-á passado os poemas à máquina, limpando-os dos seus erros ortográficos e outras muitas impurezas mais evidentes: por isso alguns ficaram no espólio pessoano, o que não é prova que Pessoa os tivesse escrito. (O Fernando costumava fazer cópias do que escrevia à máquina.) Também lá está o romance que Kamenezky quis publicar, Eliezer – o papel que nisso teve o Fernando é coisa para meditar, não aqui – e isso não quer dizer que seja de Pessoa. (Que o judeu russo lhe pagou por essas colaborações, como acusa indignadamente o Biógrafo? Porque não, se ele podia e o Fernando precisava? Pensa que ele nadava em dinheiro, como o Sr.?)
Jamais da pena de Pessoa sairiam “infantilidades” - assim por ele consideradas no prefácio - como os versos de Alma Errante. Pequenos exemplos:

Como uma borboleta voa /Atrás de outra, no ar,/Assim eu vou atrás de ti,/
Dias e noites, com o meu pensar.

Outra infantil “sinceridade”:

Quem ama e não encontra o seu ideal /É tão infeliz, e desgraçado, /
Como eu…

Dou ao Biógrafo, de borla, esta sugestão: a certa altura, uma voz feminina responde ao amado com estes esplêndidos versos: “Querido, os teus versos são pétalas / Da tua alma sofredora./ Cada uma encerra o aroma / Da tua alma sonhadora.” Mais um heterónimo neto do Fernando: heterónimo feminino do heterónimo Kamenezky…
O Biógrafo prova definitivamente a sua atribuída autoria invocando o final do poema (em que o Poeta se dirige à amada, “esculpida com persistentes marteladas / No mármore vivo da minha dor / E do meu sofrimento”) em que ela se põe a tocar Beethoven, Chopin e Mendelssohn e não músicas lá da sua terra, Kalinkas e coisas assim… (Já agora , fique sabendo que Mendelsshon era judeu!) Que o Sr. acredite que essa máquina e a secretária que acaba de comprar pelo preço de um apartamento eram do Fernando, é lá consigo, mas que queira atribuir-lhe esses versos indigentes é que já é connosco…Na sua ânsia de revelar o verdadeiro e ainda oculto Pessoa, inventa heterónimos que nunca existiram como tal ou que foram gente de verdade e, opostamente, tenta desatribuir obras, como o Guia de Lisboa que já está provado por quem sabe e pode fazê-lo que saiu mesmo da pena do Fernando… Não suba o coleccionador acima das suas colecções…
Mas olhe: por si até tenho simpatia, como por todos os coleccionadores. (Até lhe direi ao ouvido onde pode adquirir o urinol que retiraram do Martinho da Arcada de que – ah isso com certeza! – o Fernando se serviu muitas vezes!) A quem eu não perdoo é às figuras mais ou menos públicas que têm promovido os seus irresponsáveis dislates.

Álvaro de Campos, pela pena de Teresa Rita Lopes
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Nota: O meu agradecimento à professora 
Teresa Rita Lopes que hoje, dia 31 de Maio de 2012, me fez chegar este texto, depois de ler este.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

A maior novidade deste livro

Fernando Pessoa: uma quase autobiografia
de José Paulo Cavalcanti Filho

"Não será hábito começar uma recensão de um livro por citar outras apreciações já publicadas. Mas neste caso torna-se irresistível falar na maneira como a mais recente biografia de Pessoa foi sendo recebida nas últimas semanas: Fernando Pessoa seria homosexual? Sim, Cavalcanti diz que Pessoa era gay (já agora, também era Gandhi). A devassa levada a cabo pelo "Brasileiro" continuou inclusive pela descoberta de mais 55 heterónimos e por ousar dizer que Pessoa, afinal, não tinha imaginação.
Escapou a todos a maior novidade deste livro: o facto de não ser um livro com novidades.
Não me percebam mal, a edição é cuidada e a investigação minuciosa, mas (...)". Continue a ler aqui.

Nuno Hipólito

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Entre a corrida e o voo

"Não tenhamos, pois, receio de uma descoberta catastrófica que faça tábua rasa da nossa experiência - entre a corrida e o voo há a transição do salto."

Leonardo Coimbra
A Luta pela Imortalidade (1918)
p. 136

terça-feira, 22 de maio de 2012

Não foi de burro

"Não foi de burro, ajaezado à andaluza, mas de smoking, isto é, de grande burguês em traje de gala ou de «lepidóptero» engalanado, o que ia dar ao mesmo (...)."

António Quadros
da Introdução a Obra Poética Completa, de Mário de Sá-Carneiro
Publicações Europa-América (1991), pp. 19-81

Uma nova realidade aqui


"Talvez que o mais original da escrita de Mário de Sá-Carneiro seja não propriamente o insólito das situações e das personagens que elaborou, projecções de uma realidade-além e de um homem-Outro, isto é, dupla aspiração quimérica de uma objectividade e de uma subjectividade diferentes das que o envolvem e definem social e psicologicamente no extrínseco do ser, mas o modo surpreendente como utilizou os adjectivos e os advérbio ao serviço da tal diferença, procurada e obtida, fazendo-os caracterizar ou ferir os substantivos e os verbos (...) de forma tão singular, bizarra, insólita e contudo intencional, que dir-se-ia pretender o escritor a criação de uma nova realidade aqui.

António Quadros
da Introdução a Obra Poética Completa, de Mário de Sá-Carneiro
Publicações  Europa-América (1991), pp. 19-81

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Campos manifesta-se sobre os seus 206 colegas heterônimos (127+75+5)

Carta psicografada por Teresa Rita Lopes

Fernando Pessoa: uma quase autobiografia
 de José Paulo Cavalcanti Filho
"Imaginar esse livro a servir de manual aos nossos estudantes – que têm todos Pessoa nos programas – causa-me tal calafrio que dou comigo a rapar da pena para essa inglória tarefa! É que o abnegado ex-ministro declarou publicamente estar disposto a abdicar dos seus direitos de autor para, com eles, porem nas mãos dos estudantes portugueses esse instrumento indispensável. (Lembra-nos outro político mas esse, ao menos, deu-lhes um objecto útil, um computador, enquanto que este devia ser retirado do mercado. Devíamos arranjar, para controlar estas situações, algo como a ASAE, que nos defende de alimentos impróprios para consumo.)
Vamos por partes – que o livro tem 700 e tal páginas ! (...)"

Teresa Rita Lopes

sábado, 19 de maio de 2012

"Aparentemente conciliador mas intimamente revulsivo."


"103.º Dia

Com o seu inesgotável talento, aparentemente conciliador mas intimamente revulsivo, António Quadros descreve, numa palestra pública, como é que, há longos longos anos, o Estado não atende à voz dos «intelectuais», fenómeno que explica a crise que, há longos longos anos, se instalou entre nós. Não atende, quer dizer, não entende. Porque é que os «intelectuais» não deitam mão ao Poder?"

104.º Dia

(...) Que obstáculo se interpõe entre os «intelectuais» e os poderes do Estado? Shakespeare, que sabia destas coisas, fez dizer a Júlio César: «Cássio é homem perigoso. Lê muito e pensa demasiado».
Vou eu andando na rua a pensar nisto tudo e dou de caras com o Manuel Múrias que logo, truculento como uma personagem shakespereana me atira: «Sou muito seu amigo, mas já preveni na família: este Orlando Vitorino é o homem mais perigoso que há em Portugal. Se ele ganha as eleições, sou o primeiro a fugir». Não há dúvida: o Múrias também sabe destas coisas."

Orlando Vitorino
em "O processo das Presidenciais 86",
(1986), p. 62

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Da arte de contar


"A arte de contar mergulha as suas raízes num mundo primitivo ou primordial que, no entanto, nos habita ainda. Arcana ars foi o centro irradiante de onde nasceram, em formas cada vez mais independentes e separadas, a poesia, o drama, o actual romance e, até, a filosofia, se nos lembrarmos de que nos filósofos pré-socráticos, mesmo num Platão ou num Plotino, o mito mal se deixa cobrir pela reflexão. Contar foi reconstituir em palavra, em voz e em música os actos originais que fundaram o cosmos e o homem. Contar, imitando o ritmo do verso o próprio ritmo da natureza e dos ciclos criadores estabelecidos pelos deuses e, pelos génios e pelos heróis, foi manter viva, através de gerações e para além do tempo, uma tradição apontando a mitos antigos e eternos pelos quais os homens se habilitariam ao «conhece-te a ti mesmo» que, em Sócrates, aparece repetido e todavia de certo modo negado. Contar foi, afinal, interpretar o tempo presente à luz de um tempo cujos pontos idênticos e equidistantes existem infinitamente longe no futuro, de tal modo que, em última análise, passado e futuro se dão as mãos graças à palavra, anuladora do tempo, do contador de mitos ou de histórias. Assim, no mais significativo dos contos em terra portuguesa originados, o conto dos Lusíadas-argonautas que Luís de Camões narrou em estâncias epopeicas, a gesta do descobrimento é actualizada em mito, não com algo que existe no passado, mas com algo que coexiste e coexistirá sempre ao tempo dos Portugueses, dinamizando toda a sua história e marcando ao futuro uma interpretação que transformará o ciclo da viagem-tempestade-descoberta-regresso em substância de uma vida reintegrada nos arcanos divinos - pois também o homem parte, sofre e só depois de se encontrar poderá reintegrar-se no seio de uma realidade transcendente e primordial. (...)"

António Quadros
Do prefácio a Adeus, Amigo!... (1960)
de Maria Irene Dionísio

Como?

"O autor, advogado e ex-ministro brasileiro, é um apaixonado pela vida e obra do poeta da Mensagem tendo reunido neste volume um manancial impressionante de informação alguma dela nova. Uma leitura agradável que conduz à releitura de Pessoa e portanto a uma melhor compreensão de Portugal."

Carlos Fiolhais 
no Público de hoje

terça-feira, 15 de maio de 2012

No caminho para uma comunhão futura

‎"Justiça, liberdade e desenvolvimento iluminar-se-iam sob um novo foco e poderiam reconciliar-se no caminho para uma comunhão futura, se pudéssemos colocar ao seu lado, no mesmo plano de urgência, os valores da beleza, de amor e de verdade."

António Quadros

Carta de Álvaro Ribeiro a António Telmo, 30 de Outubro de 1958

(...) Nesta Lisboa dos cafés vão-se desmoronando as tertúlias, em consequência das invejas e das intrigas. Há duas semanas que não vejo o António Quadros. As conversas habituais causam desânimo. O que me vale, acredite, é o vício de escrever para longe…


Leia aqui.

domingo, 13 de maio de 2012

Franciscanismo na filosofia portuguesa


O Centro de Estudos de Filosofia (CEFi) da Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, organiza a 23 de maio um seminário integrado no projeto "Presença do Franciscanismo na Filosofia Portuguesa". Este é o primeiro de vários encontros sobre figuras franciscanas que estão a ser objeto de investigação, casos de Santo António de Lisboa, Frei Gomes de Lisboa, Frei André do Prado, Frei Cristóvão de Lisboa, Frei Agostinho de Macedo e Francisco da Gama Caeiro.
O ciclo, organizado em parceria com o Centro Cultural Franciscano, vai também centrar-se em pensadores com reflexão inspirada no carisma de S. Francisco de Assis, como Leonardo Coimbra, António Quadros e Sebastião da Gama.
A sessão inaugural realiza-se a partir das 14h30 na sala 131 da sede da Universidade Católica.

Via Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.
http://www.snpcultura.org/franciscanismo_filosofia_portuguesa.html

sexta-feira, 11 de maio de 2012

1888


"A avaliar por alguns textos até 1979 ainda inéditos e publicados em Sobre Portugal*, Fernando Pessoa terá chegado a admitir que o Encoberto era... ele próprio. Esta convicção é rastreável pelo menos entre as datas de 1925 e 1928 ou 1929, não é tão insólita como pode parecer à primeira vista, se considerarmos:
  1. A adesão de Pessoa ao conceito de uma República Aristocrática; logo, a transferência de uma Rei hereditário para uma personalidade «eleita» do alto.
  2. A desilusão, não só pela morte de Sidónio, mas sobretudo pela pouca influência que o Presidente-Rei deixou atrás de si.
  3. A sua exigência de um Quinto Império, não material, mas cultural e espiritual.
  4. O seu conceito de que os verdadeiros criadores de civilização são as grandes figuras intelectuais, como  Camões, Shakespeare - e o anunciado Supra-Camões dos artigos de 1912 na Águia.
  5. A sua insinuação de que esse Supra-Camões viria a ser o poeta então desconhecido que já experimentava dentro de si a força de um grande génio criador.
  6. A consciência da sua espiritualidade supranormal, ponteada de inspirações, iluminações, visitações enigmáticas e até fenómenos místicos, conforme vimos no capítulo anterior.
  7. Daí, a crença de que ele próprio era, como vimos, um Emissário, comissionado do Alto para trazer uma Mensagem de salvação ao povo português.
  8. Crença esta por assim dizer confirmada pela sua descoberta de que a Ordem Templária de Portugal estaria extinta em dormência desde cerca de 1888, data do seu nascimento, e de que, por conseguinte, o testemunho lhe fora passado por força do destino.
  9. E, por outro lado, a convicção de que ninguém, como ele próprio, teria entre os seus contemporâneos a capacidade de ser mais paradigmaticamente português, isto é, de ser tudo, de todas as maneiras, ou, como cantou pela voz de Álvaro de Campos no extraordinário poema, já citado, Afinal a melhor maneira de viajar é sentir - sentir de todas as maneiras (...)
  10. A certeza de que ninguém, entre os Portugueses, preencheu tão cabalmente aquela condição, ele que foi não só Fernando Pessoa, mas também Campos, Reis, Caeiro (...) desta forma realizando em sia, de forma fingida mas real, aquela supra-humanidade ou aquela semidivindade que funda o paganismo. Lembremos aqui a sua citação de Píndaro: A raça dos deuses e dos homens é uma só.
  11. Enfim, a sua descrição astrológica de uma das quadras do Bandarra, a que mais adiante nos referiremos.
Assim este homem ensimesmado, angustiado, quase apagado e aparentemente modesto, por alguns anos guardou para si, com a megalomania do génio, não diremos a convicção, mas a suspeita de que, mais do que um Emissário, seria talvez um Intermediário pesado de transcendência, esse encoberto misterioso predito pelo Bandarra e que teria vindo a esta terra infeliz para fundar o Quinto Império, o Império do Espírito Santo. (...)"

António Quadros
"1888" em Fernando Pessoa - Vida, Personalidade e Génio (1984) , pp. 244-248


[Sobre este assunto vale ainda a pena ler o texto "Fernando Pessoa - Eu ser descoberto em 2198", de Jerónimo Pizarro publicado na Revista Ler nº 109, Janeiro de  2012, disponível aqui.]

*Sobre Portugal - Introdução ao Problema Nacional. Fernando Pessoa (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Morão. Introdução organizada por Joel Serrão.) Lisboa: Ática, 1979.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Iluminantes revelações

Fernando Pessoa: uma quase autobiografia
 de José Paulo Cavalcanti Filho

"Confesso que esta noite não vou dormir a tentar lembrar-me se a sapataria onde o Pessoa elegantemente se calçava era Contente ou Contexto. É que, sem isso, como afirma o biógrafo, nunca chegaremos ao entendimento da sua obra! - à revelação do “testamento” que a obra pessoana constitui e “que esperou 70 anos” “que alguém a desvende”. Salvé, senhor ex-ministro da Justiça, que com estas iluminantes revelações vai finalmente fazer jus ao génio do Fernando!
Com igual rigor investigatório e interpretativo, diz o autor da biografia (quase) que eu me chamo Álvaro de Campos porque o Fernando tinha um dentista que se chamava Ernesto de Campos! Agora sou eu que me vou pôr a investigar sobre algo de tão importante para a minha identidade: com quantos Campos, além do engraxador, do moço dos recados e do criado de café, lidava quotidianamente o Fernando.
Peço a quem me ler, e tiver alguma informação a este respeito, que faça o obséquio de ma comunicar, que eu não tenho posses para pagar a informadores. (...)"
Teresa Rita Lopes 

Perfeitamente indispensável

Fernando Pessoa: uma quase autobiografia
 de José Paulo Cavalcanti Filho

"Prometo que me vou avidamente precipitar sobre o seu livro. Se o senhor entretanto comprar a arca, quem sabe se eu até vou escrever que saber o nome da sapataria onde o Fernando se calçava, e da rua da tabacaria que me inspirou e da lavadeira Irene e sua filha Guiomar é perfeitamente indispensável para entender a nossa obra – nossa, sim, que detenho um razoável número de quotas nessa empresa. (...)"

Teresa Rita Lopes 

Peregrinação na noite

Anrique Paço d'Arcos e Teixeira de Pascoaes
"A sua obra [de Anrique Paço d'Arcos] situa-se, sem dúvida, na esfera pascoalina do lirismo saudosista e simbolista. (...) Não é o arrebatamento sem limites, não é o poder mitogénico, não é o estilo torrencial, não é a poderosa dialéctica de sombra e de fogo, do autor de Marános, de Regresso ao Paraíso, de Elegia do Amor, porque é, digamos, um saudosismo mais humano e por isso também mais frágil, mais voltado para dentro, mais interrogativo. (...) A sua poética permanece a de um simbolismo neo-romântico, marcado pelo saudosismo e pela procura de um sentido religioso para a vida, para o cosmos e para o homem.
Mas há na sua obra uma exemplaridade de que talvez não se dê conta. É a exemplaridade do que é autêntico, do que é sério e do que se liga profundamente às raízes da sua própria identidade ou do próprio ser. (...) O itinerário de Anrique Paço d'Arcos é, no fim de contas, uma peregrinação na noite, mas com a luz do divino no horizonte."

António Quadros
"Um herdeiro dilecto de Teixeira de Pascoaes: Anrique Paço d'Arcos"
em Estruturas Simbólicas do Imaginário na Literatura Portuguesa (1992), pp. 140-143
[do artigo "A Poesia de Paço d'Arcos" publicado na revista Tempo de 27.5.1982]